São Paulo, terça, 8 de setembro de 1998

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CAOS NA RÚSSIA
Neocomunistas rejeitam oferta de mais poderes e votam contra indicação de Ieltsin, prolongando a crise política
Duma volta a rejeitar Tchernomirdin

JAIME SPITZCOVSKY
enviado especial a Moscou

A Duma (câmara baixa do Parlamento russo) rejeitou ontem, pela segunda vez, a indicação de Viktor Tchernomirdin para o cargo de primeiro-ministro.
Os deputados, liderados pela bancada neocomunista, impuseram nova derrota ao presidente Boris Ieltsin. Rechaçaram oferta de mais poderes feita pelo Kremlin e optaram por prolongar a maior crise política e econômica da Rússia desde a desintegração da União Soviética, em 1991.
O placar da Duma registrou 273 votos contra o premiê interino, 138 a favor e uma abstenção. Na primeira votação, na semana passada, Tchernomirdin teve o apoio de apenas 94 deputados.
Para ser aprovado, Tchernomirdin, um reformista moderado que havia ocupado o cargo de premiê entre 1992 e março deste ano, precisa do voto de pelo menos 226 dos 450 deputados da Duma.
Não foi divulgada uma data para a terceira e última votação sobre a indicação de Tchernomirdin. Geralmente, há um intervalo de uma semana entre essas sessões.
Em caso de nova derrota, Ieltsin tem poderes para dissolver a Duma e convocar novas eleições em até três meses.
Nesse período, governaria por decretos. Ieltsin impera protegido pela Constituição de 1993, que concentrou poderes nas mãos do presidente.
A crise econômica, provocada por uma turbulenta transição à economia de mercado, minou os poderes de Ieltsin. Os deputados exigem que ele abra mão de privilégios e fortaleça a Duma.
Negociações
Antes de os deputados votarem, Ieltsin reuniu-se no Kremlin (sede da Presidência) com as principais lideranças políticas, pró-governo e oposicionistas.
Segundo um porta-voz do Kremlin, Ieltsin fez propostas "sem precedentes" à oposição. Tais concessões não foram divulgadas pelo governo.
Os neocomunistas, que formam a maior bancada da Duma, estão divididos entre exigir outro nome no lugar de Tchernomirdin ou, mais difícil, tentar convencer Ieltsin a renunciar. O presidente russo vive o seu período de maior debilidade política desde que chegou ao poder, em 91.
A oposição acusa Ieltsin de responsável pela política econômica que levou o país à crise e de não reunir condições de saúde para governar.
O presidente enfrentou uma operação cardíaca em 96 e pneumonia no ano passado. Também admitiu sofrer crises de depressão.
Ieltsin conseguiu aumentar a votação pró-Tchernomirdin ao arrancar apoio da bancada liderada pelo líder ultranacionalista Vladimir Jirinovski.
Segundo Jirinovski, apenas "adversários" como Estados Unidos, Alemanha e Israel ganham com a crise na Rússia.
"Os deputados não estão interessados na crise", discursou Tchernomirdin. O premiê interino do país disse que, sem governo, a Rússia terá o mesmo destino da Indonésia.
O país asiático, fortemente atingido pela crise econômica, foi sacudido por saques e violência, que desembocaram na renúncia do presidente Suharto, em maio.
Tchernomirdin, 60, foi trazido de volta por Ieltsin para substituir Serguei Kirienko, 36, um defensor de reformas econômicas aceleradas. O presidente afastou Tchernomirdin por considerá-lo uma ameaça a seu poder. Atualmente, Ieltsin descreve o premiê interino, devido a sua "moderação e experiência", como o homem indicado para tirar o país da crise.



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