São Paulo, domingo, 08 de outubro de 2000

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ARGENTINA
Para maior parte da população do país, renúncia de Carlos Alvarez traz riscos à coalizão política do governo
Saída de vice pode causar fim da Aliança

GUSTAVO CHACRA
DE BUENOS AIRES

A coalizão governamental Aliança corre sério risco de rachar após a renúncia de Carlos "Chacho" Alvarez do cargo de vice-presidente da Argentina, anunciada anteontem. Essa é a avaliação de analistas e da maior parte da população.
Pesquisa do Instituto Equis, realizada na noite de sexta-feira, indica que 53,1% dos moradores da Grande Buenos Aires consideram que a renúncia de Alvarez implicará o fim da coalizão, composta pela Frepaso, liderada pelo ex-vice-presidente, e a União Cívica Radical (UCR), partido do presidente Fernando de la Rúa e dirigida pelo ex-presidente Raúl Alfonsín (1983-89).
O analista político Rosendo Fraga concorda com a população. "A saída de Alvarez do governo implica a ruptura da Aliança. Mesmo que integrantes da Frepaso sigam fazendo parte do governo, a coalizão político-social dos dois partidos se rompeu", afirmou Fraga. No entanto, integrantes da Aliança negam o fim da coalizão.
A UCR e a Frepaso se aliaram em 1997 e, em 1999, concorreram juntas para derrotar o Partido Justicialista (PJ), de Carlos Menem, que estava havia dez anos no poder. No governo, os dois partidos tiveram diversos choques. No entanto os radicais sabiam da importância dos frepasistas.
Primeiro, sem uma aliança, os radicais sabiam que dificilmente derrotariam o PJ nas eleições presidenciais do ano passado. Os políticos populares da Frepaso, como Alvarez e a ministra da Ação Social, Graciela Fernandez Meijide, ajudaram a coligação a conseguir votos. E, em segundo lugar, sem a Frepaso, a UCR perde a maioria na Câmara dos Deputados. O Senado é controlado pelos opositores justicialistas.
Ideologicamente, no entanto, os dois partidos sempre divergiram, segundo o analista Oscar Raúl Cardozo. As diferenças em relação à composição do novo Gabinete e a postura dos dois lados no caso dos subornos no Senado, no qual senadores teriam repartido cerca de US$ 10 milhões para aprovar a reforma trabalhista, são prova disso.
Alvarez, que como vice-presidente acumulava a Presidência do Senado, conforme prevê a Constituição argentina, defendia a renúncia de todos os senadores para viabilizar a antecipação das eleições previstas para o próximo ano. Porém, como disse o ex-vice-presidente no seu discurso de renúncia, "o governo preferiu se manter em silêncio".
O afastamento de dois altos funcionários do Poder Executivo suspeitos de envolvimento no pagamento de subornos era outro pedido de Alvarez. Porém De la Rúa, ao realizar a reforma ministerial, manteve no governo Alberto Flamarique, acusado de negociar os subornos, apenas o transferindo de pasta. Fernando de Santibañes, secretário de Inteligência e suspeito do pagamento de subornos, foi mantido na mesma função. Pressionados, os dois apresentaram as suas renúncias. A de Santibañes não foi aceita.
Agora, correndo risco de perder a governabilidade, De la Rúa deve se aproximar do ex-presidente Carlos Menem (1989-99), segundo o analista político Rosendo Fraga. "Mas isso quitará ainda mais o caráter de transparência da gestão de De la Rúa, que já está muito manchado." Menem já vem dialogando com De la Rúa e se disse disposto a ajudar o governo no que for preciso.
Alvarez, inimigo de Menem desde que deixou o PJ em 1990, deve se aproximar do ex-ministro da Economia Domingo Cavallo. Apesar da ampla diferença ideológica, pois Cavallo é um político de direita, enquanto Alvarez é de centro-esquerda, os dois concordam que algo precisa ser feito em relação à economia do país e a política precisa passar por uma "grande limpeza".
"Seria uma aliança tática, mas que dificilmente se converterá em uma coalizão eleitoral", diz Fraga. Cavallo, que rachou com Menem em meados dos anos 90, fundou seu próprio partido, a Ação pela República, e concorreu à Presidência no ano passado, ficando em terceiro lugar.
Na avaliação de Fraga, os grandes vitoriosos são os governadores do Partido Justicialista, especialmente de Carlos Ruckaulf, da Província de Buenos Aires. Sua administração é popular e ele está distante do escândalo no Senado. Também é rompido com o menemismo, o que elimina uma certa carga de ligação com a corrupção.
Entre Alvarez e De la Rúa, o ex-vice recebeu uma avaliação melhor da população, segundo a Equis. Para 67,2%, sua imagem é positiva, contra 28,1% de De la Rúa. Porém 51,6% discordou da renúncia de Alvarez. "Para a opinião pública, Chacho venceu", diz Fraga. "Mas não sei qual deles terá mais vantagem politicamente", acrescenta.
A avaliação de como fica o governo sem Chacho é a mais grave para De la Rúa. Apenas 4,7% consideram que ele será positivo, segundo o instituto Equis.



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