São Paulo, domingo, 8 de novembro de 1998

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MORTE PRECOCE
Suicídio já é a segunda causa de morte entre pessoas de 15 a 24 anos no país; governo cria equipe de especialistas
França tenta conter suicídio de jovens

MARIANA SGARIONI
de Paris

O suicídio é a segunda causa da morte de jovens entre 15 e 24 anos na França, ficando atrás só dos acidentes de carro, segundo o Inserm (Instituto Nacional de Saúde e Pesquisa Médica). Para tentar controlar o problema, o Ministério da Saúde francês formou, no mês passado, uma equipe de especialistas que deverá atuar nas escolas a partir do ano que vem.
Segundo esses especialistas, é possível identificar e evitar a maior parte dos suicídios desses jovens. Pelo menos uma semana antes de uma tentativa de suicídio, a maioria dos adolescentes teria chegado a consultar um médico da escola ou professor para reclamar de algum problema físico -como dores ou dificuldades de respirar.
Como os médicos e professores não estão preparados para reconhecer um possível sintoma de um suicida, a equipe do Ministério da Saúde visa dar um treinamento específico para esses profissionais.
De acordo com o ministério, 40% dos adolescentes que tentaram se suicidar fizeram uma nova tentativa no ano seguinte. Segundo Bernard Kouchner, secretário da Saúde, a prevenção do suicídio será uma das prioridades da saúde pública francesa em 1999.
Atualmente, as estruturas médicas para atender os adolescentes que tentaram se matar são quase inexistentes na França. De um total de 400 postos públicos de pediatria, apenas 40 dispõem de um espaço para os maiores de 15 anos.
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Atendimento especializado Em todo o país, apenas o Centro Abadie, em Bordeaux, conta com um serviço de atendimento específico para os jovens suicidas e para seus pais.
O centro de atendimento existe desde 1992 e recebe cerca de 400 jovens por ano. Os adolescentes que tentaram se matar chegam ao hospital no setor de emergência.
Depois de providenciados os primeiros socorros, os jovens são encaminhados para os psiquiatras, que propõem uma internação voluntária no centro. A equipe conta com psiquiatras, psicólogos, assistentes sociais, enfermeiras e arrumadeiras.
A internação também acontece com jovens que, em algum momento, apresentaram idéias suicidas, mas que não necessariamente as colocaram em prática. Nesse caso, o encaminhamento é feito pela família ou pelo psicólogo do adolescente. O hospital chega a receber 15 jovens por dia, segundo afirmou o psiquiatra Xavier Pommereau, responsável pelo centro.
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Desunião e abuso sexual As características dos adolescentes internados em Bordeaux e de suas famílias têm alguns pontos em comum, como a desunião familiar e o abuso sexual. É o que afirma Marie Faure, assistente social do centro encarregada do atendimento às famílias dos jovens suicidas.
"Não se pode generalizar, dizendo que todo jovem filho de pais separados têm a tendência suicida, mas a desagregação familiar é uma característica comum a todos os que chegam aqui", disse Faure. Segundo ela, em 1996, 30% dos internos no centro tinham sofrido algum tipo de abuso sexual.
"Os abusos nem sempre partem dos pais. Muitas vezes o agressor é um parente, vizinho ou até mesmo o irmão mais velho. Esse último é o pior, pois os pais se negam a admitir que o filho seria capaz dessa atrocidade e acabam fechando os olhos para o problema", afirmou a assistente social.
De acordo com Pommereau, a conduta suicida é forte principalmente nos países da Europa do Norte. "Na França, tivemos um aumento das tentativas de suicídio entre jovens no período de 1975 e 1985", afirmou o psiquiatra, em entrevista à Folha.
Segundo Pommereau, o aumento se deve a uma conjunção de fenômenos sociais e psicológicos. "Após a década de 70, houve uma forte ruptura social e econômica, que mexeu diretamente com a vida dos jovens."



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