São Paulo, terça-feira, 09 de outubro de 2001

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Organizações humanitárias criticam "pão e bombas"

DA REDAÇÃO

A "operação pão e bombas", apelido da combinação de ataques militares e ações humanitárias que tem caracterizado a ofensiva liderada pelos EUA ao Afeganistão, foi criticada ontem por organizações humanitárias.
Segundo o Departamento de Defesa dos EUA, menos de nove horas após o início do primeiro ataque, anteontem, dois aviões C-17 lançaram 37 mil pacotes de comida em "áreas remotas" do Afeganistão -e mais lançamentos estavam planejados para ontem. Os pacotes continham uma ração diária de feijão, arroz, barras de frutas, manteiga de amendoim e geléia de morango.
Mas um porta-voz da Oxfam, uma das maiores agências humanitárias do mundo, disse que, apesar de EUA e Reino Unido apresentarem as medidas como uma "combinação coerente" de ações militares, diplomáticas e humanitárias, elas são "confusas e quase totalmente despreparadas para uma crise nessa escala".
Segundo a Oxfam, lançamentos aéreos são ineficientes se comparados à distribuição terrestre. "Jogar coisas do céu é mais uma jogada de marketing do que um esforço bem preparado de auxílio", disse o porta-voz. "Lançamentos aéreos são muito aleatórios. Você não sabe se está jogando comida para uma cidade, para o Taleban ou para quem está precisando."

ONU
O Programa Mundial de Alimentação da ONU suspendeu a entrega de alimentos ao Afeganistão após os ataques de 11 de setembro aos EUA, provocando críticas de organizações humanitárias. O programa retomou o envio de 500 toneladas de alimentos por dia em 29 de setembro, mas ele voltou a ser suspenso ontem.
A ONU estimou que 55 mil toneladas de comida por mês precisariam ser enviadas ao Afeganistão para alimentar cerca de 6 milhões de pessoas. "Isso significa 1.800 vôos de Hércules por mês. É simplesmente impossível", disse o porta-voz. Mas, segundo ele, as linhas de distribuição terrestre usadas pela ONU ainda existem e poderiam ser usadas.
Segundo uma reportagem publicada ontem na revista britânica "The Economist", os EUA estão considerando a possibilidade de mudar de tática. A Usaid, organização humanitária financiada pelo governo dos EUA, teria sugerido o envio de grandes quantidades de pão e leite a comerciantes locais.
"Impulsionados pela vontade de ganhar dinheiro, comerciantes são capazes de distribuir comida de forma mais rápida, a locais mais distantes e áreas mais perigosas do que burocráticas agências de auxílio humanitário."
Outro perigo apontado pela Oxfam é o de "sujar" a imagem das organizações humanitárias.
"Não se pode misturar a operação militar com a humanitária porque a Oxfam e outras agências vão acabar sendo vistas como parte da operação militar, e isso não pode acontecer", afirmou.
A organização Médicos Sem Fronteiras, Nobel da Paz de 1999, também alertou para o perigo.
"A confusão entre ajuda humanitária e militarismo só aumenta o perigo de já complicadas ações humanitárias, restringindo ainda mais as possibilidades de intervenção", disse a entidade em nota à imprensa. "Não se trata de ajuda humanitária, mas de propaganda militar planejada para garantir a aceitação internacional dos ataques liderados pelos EUA."



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