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COMENTÁRIO
Política se abre à lógica das celebridades
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
Arnold Schwarzenegger entra
na política por uma porta inabitual. A porta das celebridades. Há
nisso um curioso paradoxo, já
que a celebridade é, por definição,
uma pessoa de quem não se espera conteúdos sociais ou modelagens administrativas.
A lógica das celebridades é mais
tosca. Elas devem produzir pequenos fatos que abasteçam suas
próprias imagens e fazê-los circular no mercado do showbiz, da
comadrice e das fofocas.
Não precisam necessariamente
pensar. Nem entender de finanças
públicas, ter idéias sólidas sobre
políticas sociais ou situar-se em
algum ponto do espectro ideológico. Foi assim com o finado Elvis,
é assim com Britney Spears.
Em 1966, um outro ator, Ronald
Reagan, foi eleito governador da
Califórnia. Mas o paralelo entre
ele e Schwarzenegger é imperfeito. Bem menos célebre, Reagan já
era a seu modo um ativista conservador. Seguiu a mesma trilha
de Walt Disney ou Elia Kazan ao
depor voluntariamente na comissão do senador Joseph McCarthy,
que caçava na sociedade suspeitos
de simpatias pelo comunismo.
Reagan fora antes líder sindical
entre os atores, estimulado por
sua primeira mulher, a atriz Jane
Wyman. E deu uma guinada para
a direita, aconselhado pela também atriz Nancy Davis, sua segunda mulher.
Assim, não foi por seu passado
em Hollywood que, ao se eleger
presidente dos Estados Unidos,
em 1980, ele acelerou a corrida armamentista e colocou a então
União Soviética na rota da implosão. O então presidente personificava algo mais complexo: uma
coalizão formada em torno do
Partido Republicano, que poria
fim à Guerra Fria e asseguraria a
supremacia norte-americana.
Schwarzenegger traz um perfil
bem mais modesto. Sua imagem
pública se confunde amplamente
com a de seu principal personagem, o Exterminador, que é mais
músculos do que cérebro. Numa
sociedade em que academias de
musculação pesam mais que saraus literários na constituição do
hedonismo, é óbvio que seus admiradores não se preocupem em
saber se ele possui uma biblioteca
particular ou os gêneros de livros
que nela predominam.
Na recente história norte-americana, a política incorporou a lógica das celebridades no início
dos anos 60, com John Kennedy.
Bill Clinton tangenciaria o mesmo caminho. Mas foram fenômenos isolados. A demanda formulada na direção dos políticos mistura linha justa e consistência. Os
factóides servem apenas de enfeite, como a cereja em cima do bolo.
Schwarzenegger candidatou-se
sem carregar a responsabilidade
pela crise de energia e pelo déficit
fiscal na Califórnia. A indústria do
entretenimento produz discursos
alheios aos problemas gerados
pelo establishment local. De certo
modo, o eleitor californiano votou no escuro. Pode até ter acertado. Mas terá sido sem querer.
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