|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Ex-escravas sexuais coreanas ainda esperam compensação
RICHARD LLOYD PARRY
do "The Independent", na Coréia do Sul
Em meio aos campos de arroz do
povoado de Twae Chon, a uma hora e meia de carro de Seul, Nanumui Jib seria um lugar tranquilo
para qualquer pessoa passar o fim
da vida. O nome significa "Casa da
Partilha", e nela, sob os cuidados
de quatro assistentes em tempo integral e grande número de voluntárias, vivem sete senhoras coreanas de entre 73 e 85 anos de idade.
Durante a maior parte da semana elas têm uma vida calma. Várias
das senhoras são artistas habilidosas e, na maioria dos dias, recebem
visitantes a quem mostram seu pequeno museu.
Essa rotina é interrompida uma
vez por semana. Todas as quartas-feiras elas vão até Seul para se reunir em frente à embaixada japonesa. Ali, acompanhadas por outras
senhoras, cantam, gritam e choram os sofrimentos do passado e a
injustiça do presente.
A Casa da Partilha é um lugar onde a agonia da Segunda Guerra
Mundial se mantém viva. Suas residentes foram todas "comfort women" (mulheres que provêem
conforto), eufemismo amargamente irônico usado pelo Exército
imperial japonês para designar as
centenas de milhares de mulheres
recrutadas à força para atuarem
como prostitutas na frente militar.
As chamadas "estações de conforto" onde elas eram escravizadas, foram montadas em todas as
partes dos territórios conquistados pelo Japão. Entre as escravas
figuram filipinas, chinesas, indonésias, tailandesas e cambojanas.
Mas quatro em cada cinco eram
coreanas, e é na Coréia que sua
causa é mais defendida.
Um caso típico entre elas é o de
Kim Soon Duk, arrancada do povoado em que vivia em 1937, aos 17
anos. A Coréia já era colônia do Japão havia 27 anos, e o Exército imperial estava estendendo seu domínio pela China. "Os militares
iam até cada casa e exigiam que cada família providenciasse uma
moça. Era como se estivéssemos
em guerra e estivessem recrutando
jovens para servir no Exército."
Às moças foi dito que trabalhariam como enfermeiras ou costurando uniformes no Japão. A verdade só veio à tona quando Kim
chegou a Xangai. "Chorei noites a
fio. Algumas de minhas amigas,
que vieram comigo, se mataram."
As estimativas quanto ao número de escravas variam entre 80 mil
e 300 mil. Para as sobreviventes, o
sofrimento não terminou com o
fim da guerra. Muitas se viram em
lugares distantes da Ásia, sem poder voltar para casa. Aquelas que
conseguiram se chocaram com
uma sociedade confuciana profundamente conservadora, para a
qual sua violação era motivo mais
de vergonha do que de compaixão.
Foi apenas em 1991 que uma escrava sexual coreana falou abertamente sobre o que lhe aconteceu.
Desde então, o problema se tornou
o mais complicado na delicada relação entre Coréia do Sul e Japão.
No ano passado, o governo japonês ofereceu 3 milhões de ienes
(US$ 20 mil) às escravas sobreviventes, acompanhados de um pedido de desculpas do então premiê, Ryutaro Hashimoto. Mas Tóquio vem se recusando a pagar
qualquer compensação oficial. O
dinheiro foi dado por empresas
privadas, e apenas um punhado de
ex-escravas o aceitou.
²
Tradução de
Clara Allain
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|