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Assessor de Lula rejeita críticas feitas pelos EUA
ELIANE CANTANHÊDE
DIRETORA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O assessor internacional da Presidência, Marco Aurélio Garcia,
classificou ontem de "estapafúrdias" as declarações do secretário-assistente de Estado do governo George W. Bush, Roger Noriega, de que a Argentina está fazendo um "giro à esquerda" e se
aproximando de Cuba.
"Essas reações [de Noriega] são
estapafúrdias, a não ser que alguém esteja querendo criar confusão", disse Garcia à Folha, por
telefone, ressaltando em diferentes momentos da conversa que as
relações do Brasil com os EUA estão "ótimas".
Para Garcia, o secretário-assistente não está usando um tom diferente do usado por seus superiores no governo Bush: "Ele está
falando como funcionário de governo ou como refugiado cubano?", ironizou o brasileiro. Apesar
de ferrenhamente anticastrista,
Noriega é americano de família
mexicana -e não cubana.
De uma forma ou de outra, Garcia acha "surpreendente" que Noriega esteja tão livre para falar o
que pensa: "Como funcionário de
governo, ninguém se libera de
suas convicções pessoais, mas
precisa ter enorme cuidado ao comentar questões dessa grandeza,
sobretudo para não criar um foco
desnecessário de tensão".
Garcia criticou a interferência
na política interna da Argentina e
da Venezuela e avaliou que o problema é a existência de "uma série
de vetores" e de "umas sete cabeças" definindo a política externa
americana.
"Não vejo sentido em que, às
vésperas da Cúpula das Américas
[que será na próxima semana, em
Monterrey, no México], funcionários de segundo e até de terceiro escalões fiquem fustigando
presidentes como Hugo Chávez
[Venezuela] e Néstor Kirchner
[Argentina]", disse.
Além das críticas de Noriega à
Argentina, assessores do Departamento de Estado dos EUA vêm
dando sucessivas declarações a
jornais e agências de notícias criticando Chávez, acusando-o de fomentar o antiamericanismo na
América Latina ou até de abrigar
terroristas de origem árabe.
Uma das acusações comuns é a
de que Chávez teve encontro com
Evo Morales, um dos líderes de
oposição na Bolívia, considerado
à esquerda do atual governo. Mas,
lembrou Garcia, o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva já
conversou com Morales.
"Qual o sentido de estigmatizar
o Morales? Ele se incluiu no jogo
democrático, lidera uma corrente
política e um partido legal."
Agenda de Monterrey
Hoje, Garcia participará de reunião com Lula e o chanceler Celso
Amorim justamente para discutir
a participação do Brasil em Monterrey e os temas da conversa em
separado que o presidente brasileiro terá com seu colega americano, George W. Bush.
Segundo Garcia, o encontro será curto, "porque os dois têm se
encontrado e conversado bastante", inclusive quando Bush telefonou no dia seguinte à prisão de
Saddam Hussein, em dezembro, e
pediu ajuda a Lula para fazer
avançar as negociações para a implantação da Alca (Área de Livre
Comércio das Américas). O Brasil, porém, não quer incluir a Alca
no texto da Cúpula das Américas,
ao contrário dos EUA.
Na semana que vem, os dois
presidentes vão discutir uma
"agenda positiva", como a evolução das negociações da Alca e as
questões bilaterais. Mas o assessor admitiu que deverão também
comentar "essa coisa de funcionários falando demais".
Apesar das declarações americanas contra Chávez, Kirchner e
Fidel Castro, de Cuba, Marco Aurélio Garcia diz que a posição do
governo americano em relação à
América Latina tem sido "de sapiência": "As relações com o continente têm sido adequadas".
Garcia avaliou também que as
relações econômicas seguem normais. Exemplo: Chávez condenou
duramente a guerra do Iraque,
mas em nenhum momento faltou
petróleo venezuelano nos EUA.
Mesmo que um governo não goste do outro, os interesses econômicos têm sido preservados.
Garcia não soube ou não quis
dizer, mas há a possibilidade de
Lula se oferecer como moderador
entre Bush e Chávez depois das
seguidas reportagens originadas
no Departamento de Estado contra a Venezuela. Depois de conversar na semana que vem com
Bush, Lula deverá ir em fevereiro
à Venezuela, para um encontro
multilateral.
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