São Paulo, terça-feira, 10 de janeiro de 2006

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ANÁLISE

Solidão e derrota motivam suicídio

RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma derrota -ou a impressão de que se está derrotado- e a natural "solidão do comando" são as principais causas da tentativa de suicídio de um comandante militar. Em tempos de paz ou até mesmo em guerras de "baixa intensidade", os índices de suicídio entre militares e civis são semelhantes. Pode ser mesmo menor entre o pessoal de farda. Mas qualquer um pode se matar se o nível de estresse é elevado demais.
Generais e almirantes se suicidam menos do que soldados e marinheiros. Soldados, sargentos e oficiais subalternos em combate se matam quando o estresse da luta chega a níveis intoleráveis.
Um comandante não sofre tanto fisicamente. Mas ele é o responsável final pelas ações dos seus subordinados. Suas decisões podem ter a ajuda de um colegiado, um "Estado-Maior", mas ele é o responsável final.
Em caso de derrota, que pode significar a morte de muitos de seus comandados, o estresse pode levar ao suicídio.
Em algumas Forças Armadas, ao longo da história, isso era praticamente institucional. Generais japoneses derrotados regularmente se matavam antes de serem capturados pelos aliados na Segunda Guerra. Mesmo na tradição militar ocidental, o suicídio poderia ser uma saída honrosa: o capitão morre com seu navio. Isso pode ocorrer na hora do naufrágio ou depois.
O capitão alemão Hans Langsdorff comandava o "couraçado-de-bolso" -um cruzador hiperarmado- Graf Spee, que batalhou com três cruzadores britânicos ao largo do rio da Prata em 1939. Langsdorff refugiou-se em Montevidéu. Estava impressionado com a morte de alguns de seus marinheiros. Achava que logo seria destruído por uma enorme força britânica que se avizinhava. Não era o caso, mas ele se enrolou em uma bandeira e se matou.
Um teatro de operações é, sem dúvida, um local estressante. Tanto pelo combate quanto pelo entorno -pobreza, degradação, falta de perspectivas da população. Mas a vida civil também pode ser.
Em 2003, tropas do Exército dos EUA no Iraque tiveram um índice de 17,3 suicídios em cada 100 mil militares, acima da média geral da força, de 12,8 por 100 mil. O índice caiu em 2004, para 7,9 em cada 100 mil militares. Em compensação, a média nacional americana é de 21,5 suicídios em cada 100 mil homens de 20 a 34 anos.
Raros são os suicídios em que não se tem algum aviso prévio do ato. Palavras e gestos podem comunicar a intenção a quem está em volta, e uma conversa, impedir o ato. Mas, no caso de um comandante militar, a clássica "solidão do comando" milita contra essa válvula de escape.


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