|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Pragmático, Planalto considera pacote de mudanças como "questão interna"
ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
O governo Luiz Inácio Lula
da Silva está cada vez mais desconfiado dos rumos que o presidente Hugo Chávez imprime
à Venezuela, mas o que importa
é que Chávez é muito conveniente (ou "excelente") para os
interesses brasileiros e ninguém quer se meter nas "questões internas" do país vizinho.
Chávez está reestatizando e
pretende nacionalizar empresas nas áreas de energia e telecomunicações, tirar a autonomia do Banco Central e intervir
em empresas de comunicação,
anunciando uma "revolução
socialista". O Brasil prefere interpretar todos esses passos
não como socialistas, mas sim
como "capitalismo de Estado".
"O Brasil é amigo do Chávez,
e ele é nosso amigo também",
disse ontem à Folha por telefone, da Nicarágua, o assessor internacional da Presidência,
Marco Aurélio Garcia. Para ele,
as medidas lançadas por Chávez para seu novo mandato são
"questões internas da Venezuela" e não há nenhum indício
de endurecimento do regime.
"As medidas têm cunho econômico. Chávez vem de uma
eleição recente e consagradora,
tem sido altamente beneficiado pela democracia e certamente seu interesse só pode
ser aprofundá-la", disse Garcia,
que ocupou interinamente a
presidência do PT em novembro e dezembro passados.
O motivo de tanta boa vontade com a Venezuela e com o regime Chávez pode ser explicado por ideologia, mas também
por números. A Venezuela é
um mercado milionário para
produtos e serviços brasileiros.
Na avaliação pragmática tanto do Planalto como do Itamaraty, Chávez pode ter lá suas
idiossincrasias, mas sua política contrária aos EUA e voltada
ao sul do continente é "excelente" para o Brasil.
Em resumo, Chávez praticamente cedeu as principais
obras da Venezuela a três empreiteiras brasileiras: Odebrecht, Andrade Gutierrez e
Camargo Corrêa. E vem mais
por aí, porque pelo menos uma
delas deverá participar da
construção da hidrelétrica de
Tocoma, ao norte do país.
No ano passado, o Brasil exportou para a Venezuela US$ 1
bilhão a mais do que para o Reino Unido e também para a
França, tradicionais parceiros
comerciais brasileiros.
De janeiro a novembro, as
exportações para o país de
Chávez foram de US$ 3,3 bilhões, contra importações de
apenas US$ 548 milhões, com
um superávit a favor do Brasil
de US$ 2,7 bilhões.
A Venezuela compra todo tipo de produtos, inclusive quinquilharia, da Zona Franca de
Manaus. Na pauta de exportações, lideram automóveis e tratores; máquinas, aparelhos e
terminais elétricas; e caldeiras.
Quanto ao endurecimento e
ao fechamento do regime, trata-se de questões consideradas
"secundárias" nas áreas políticas do governo brasileiro, apesar de assustarem as áreas mais
econômicas, como os ministérios de Minas e Energia e do
Desenvolvimento.
Na área política, a orientação
evidente é tratar os anúncios
de Chávez -inclusive sua disposição de permitir reeleições
sucessivas, sem limite- como
"questões internas", como disse explicitamente Garcia.
Texto Anterior: Entrevista: Chavista vê risco autoritário Próximo Texto: Pacote para a Nicarágua deve ser anunciado hoje por Chávez Índice
|