|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CHILE
Mulher do presidente deposto em 1973 por Pinochet quer que ele revele onde estão enterrados os desaparecidos políticos
Viúva de Allende vê democracia imperfeita
do enviado especial a Santiago
Para Hortensia Allende, 83, viúva de Salvador Allende, o presidente socialista deposto por Pinochet em 1973, a permanência do
general como figura central da política chilena 25 anos depois do
golpe mostra que a democracia
chilena é imperfeita e limitada.
"No plebiscito de 1988, o povo
chileno disse que não queria mais
Pinochet no poder, mas ele continuou sendo protagonista e, agora,
vai ocupar uma vaga no Senado
que ele mesmo fechou. Isso mostra que vivemos numa democracia
muito limitada", afirmou à Folha.
Salvador Allende se suicidou
quando o Palácio de la Moneda foi
invadido pelos golpistas. Leia os
principais trechos da entrevista
concedida por Hortensia em sua
casa em Santiago.
(OTÁVIO DIAS)
Folha - O general Augusto Pinochet continua sendo a figura central do Chile, 25 anos depois do
golpe de Estado que depôs seu
marido. O que a sra. gostaria de dizer sobre a ida dele ao Senado?
Hortensia Allende - É verdade
que Pinochet continua a figura
central do Chile, apesar do resultado do plebiscito de 1988, quando
os chilenos votaram pelo "não",
deixando claro que não o queriam
no poder. Depois, vieram os governos democráticos, a transição,
mas ele continuou sendo protagonista durante os mandatos de Patricio Aylwin e de Eduardo Frei.
E agora, o homem que fechou o
Congresso, que destruiu os registros eleitorais, chega ao Senado
como senador vitalício porque assim determina a Constituição de
1980. Tudo isso mostra que a democracia que vivemos é muito imperfeita e limitada. A maioria dos
chilenos é contra a Constituição de
80, é contra os senadores designados e vitalícios, é contra a permanência de Pinochet no poder.
Folha - A sra. vai participar de
manifestações contra o general?
Allende - Eu estarei em Valparaíso amanhã porque minha filha,
Isabel Allende, tomará posse como deputada. Mas não irei ao Senado, onde estará Pinochet.
Folha - O que a sra. espera de Pinochet no Senado?
Allende - Não se deve esperar
muito porque ele é um homem de
pouca luz, é um homem inculto.
Ele tem sentido político, mas não
está preparado para ser senador.
Ele se expressa mal e já está muito
vacilante. Acho que seu papel será
muito restrito, inclusive porque a
direita não quer aparecer demasiadamente unida a Pinochet.
Folha - Alguns senadores contrários a Pinochet dizem que algo positivo no fato de Pinochet se tornar
senador: ele estará em igualdade
de condições com os outros e terá
de responder perguntas que até
agora se negou a responder. Que
pergunta a sra. faria a ele?
Allende - A pergunta que todos
temos à flor da pele é onde estão
enterrados os desaparecidos políticos. Pinochet nunca respondeu
onde foram parar as pessoas que
morreram durante o regime militar. Ele traiu Salvador Allende, e
faz parte de sua mente e de seu raciocínio eliminar os que atrapalham sua trajetória até o poder.
Folha - Do ponto de vista econômico, o governo de Pinochet teve
êxito e, por isso, ele e os militares
chilenos se sentem vitoriosos.
Qual é a sua opinião sobre isso?
Allende - Não sei se eles podem
ser considerados vitoriosos. Não
me parece que alguém que tenha
desprezo pelos direitos humanos
pode se considerar vitorioso.
Folha - Na sua visão, qual o erro
cometido por Allende que contribuiu para o golpe de Estado?
Allende - O grande erro foi que
Allende foi eleito presidente em
1970 com apenas cerca de 36% dos
votos. E deveria ter governado
considerando que não era um governo majoritário. Deveria ter governado com a democracia cristã.
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|