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São Paulo, terça-feira, 10 de junho de 2003

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COMENTÁRIO

A guerra civil palestina já começou

WILLIAM SAFIRE
DO "NEW YORK TIMES"

"Não vamos permitir que ninguém nos arraste para uma guerra civil", declarou o premiê palestino, Abu Mazen.
Sua oposição desleal -o Hamas, o Jihad Islâmico e as Brigadas dos Mártires de Al Aqsa- enviou uma mensagem diferente a Mazen e a outros líderes árabes que tinham acabado de ver o presidente George W.Bush.
Numa ação conjunta, os três grupos terroristas enviaram três suicidas a um posto do Exército em Gaza. Mataram quatro soldados antes de serem mortos. Em seguida, a frente terrorista divulgou um vídeo mostrando os matadores com rifles e um Alcorão e informou: "O sangue dos palestinos diz que estamos unidos na trincheira da resistência".
Poderia a guerra civil palestina ter sido declarada de maneira mais dramática?
De um lado temos Mazen, devidamente eleito pelo Legislativo palestino, objeto de injúrias por parte da frente terrorista porque ele acredita que continuar a guerra contra Israel só causará mais sofrimento aos palestinos.
De outro, a frente fundamentalista que tem como missão declarada expulsar os odiados judeus do Oriente Médio. Unidos como nunca, estão decididos a derrubar Mazen e qualquer "moderado" capaz de negociar um acordo.
Jogando dos dois lados, como sempre, está Arafat, ajudando a frente a solapar Mazen antes que ele consiga formar uma base de apoio local que possa pôr fim à guerra. Na cúpula recente, Arafat tentou fazer Mazen soar como fantoche de Israel e dos EUA, mandando um assessor dar a entender que a pressão americana tinha excluído do discurso do palestino um ""direito ao retorno" dos refugiados a Israel.
Assim, de um lado temos a frente do terror, apoiada por Arafat, abertamente travando uma guerra civil para assumir o controle da causa palestina, enquanto o outro lado -a Autoridade Palestina, desde pouco tempo encabeçada por Mazen- protesta, dizendo que não deixará ninguém "nos arrastar para uma guerra civil". O primeiro lado está vencendo.
Mas como pode haver uma guerra civil se palestinos não estão matando palestinos? É simples: a frente rebelde mata israelenses, forçando o premiê Ariel Sharon a ordenar a retaliação contra os terroristas. E o resultado são mortos palestinos, tanto terroristas quanto vítimas inocentes.
Os rebeldes sabem que nenhum governo que está sendo alvo de ataques terroristas contínuos pode ficar imóvel. Israel será obrigado a continuar reagindo até que a nova liderança palestina consiga controlar os assassinos dentro de sua própria população.
No passado, o argumento principal usado para justificar a inação era o de que a força policial palestina -bem equipada e de dimensões razoáveis, conhecedora dos esconderijos e da logística dos rebeldes- estaria desmoralizada, enfraquecida pelos contra-ataques israelenses e impotente para agir contra os fanáticos.
Pode ser. Concedendo a Mazen o benefício da dúvida, Sharon instruiu seu ministro da Defesa, Shaul Mofaz, a traçar um arranjo com Muhammad Dahlan, o chefe de segurança de Abu Mazen.
A idéia é que Dahlan escolha uma área para afirmar o controle da Autoridade Palestina. As forças israelenses se retirarão dessa área. Quando um esforço de 100% para impedir o terrorismo for demonstrado na área, o esquema se estenderá para a cidade ou o povoado mais perto, até que os bairros e regiões dominados pelos rebeldes se encolham e a Autoridade Palestina conquiste o controle interno -um pré-requisito à formação de um Estado.
Será que Sharon vai reagir positivamente à redução do terror? É claro que sim. Ele possui o respaldo nacional necessário para poder fazer concessões que não prejudiquem a segurança.
Mazen pode encontrar uma base de apoio semelhante para derrotar a frente terrorista? Ou será que se contentará com um simples "cessar-fogo" que nada significa, permitindo que o terror se rearme e prolongue a agonia palestina? Ele pode obter apoio financeiro dos sauditas e ajuda na segurança dos egípcios -isso porque o presidente Bush, depois de derrotar Saddam Hussein, escolheu o momento certo para sua intervenção, digna de crédito.
Mas não existe nenhuma imposição externa capaz de levar a paz duradoura ao Oriente Médio. Ela se dará quando os palestinos celebrarem sua vitória contra uma minoria terrorista que os arrastou para a guerra civil.


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