São Paulo, sábado, 10 de setembro de 2005

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VIOLÊNCIA

Probabilidade de sofrer agressão é duas vezes maior do que a média no país; Congresso votará legislação mais rigorosa

Nos EUA, indígenas são maior alvo de violência sexual

Jose Miguel Gomez/Reuters
Índio de Wisconsin, vestindo pele de urso, posa em frente ao Congresso, em Washington


DIANA MARRERO
DO "USA TODAY", EM WASHINGTON

Quando Lisa Iyotte foi estuprada, em 1994, tornou-se parte de uma estatística assustadora: uma em cada três mulheres indígenas nos EUA sofrerá estupro.
Isso significa que a probabilidade de que sofram agressão sexual é quase duas vezes maior do que a média entre as mulheres americanas, segundo estimativas do grupo de combate à violência contra a mulher do Congresso Nacional Indígena dos EUA. E, como Iyotte, 37, membro da tribo sioux rosebud, em Dakota do Sul, as mulheres indígenas americanas têm maior probabilidade de viver em comunidades pobres e distantes, nas quais serviços de assistência às vítimas são raros ou inexistentes.
Para agravar o problema, os líderes indígenas americanos dizem que existem muitas disputas de jurisdição entre o governo federal e os governos tribais, e que isso muitas vezes permite que os agressores escapem impunes.
"Não é aceitável", diz Iyotte. "Mas ninguém quer falar do problema, e por isso ele persiste."
Os ativistas da causa, porém, dizem que o Congresso está se preparando para aprovar uma versão mais severa da Lei de Combate à Violência contra Mulheres, que reforçaria a proteção às mulheres indígenas. A lei original, de 1994, expira no final deste mês, a não ser que os legisladores votem sua renovação.
Uma nova versão do projeto de lei reforçaria a capacidade das tribos para processar os agressores, ampliaria os trabalhos de pesquisa sobre a violência contra mulheres indígenas, aumentaria as verbas federais para serviços tribais e garantiria melhor cooperação entre as tribos do país e o governo federal.
Uma cláusula essencial estabeleceria um registro nacional de criminosos sexuais e de ordens de proteção a indígenas, para que as tribos possam vigiar os agressores que se mudam para outras reservas. O projeto de lei também permitiria que as agências policiais das tribos usassem bancos de dados criminais em suas pesquisas e acrescentassem a eles dados sobre os criminosos em suas regiões.
O apoio adicional do governo federal não poderia chegar em momento melhor para tribos que vêm lutando para virar a maré de abuso em suas comunidades, dizem os ativistas.
"Se não fossem esses programas federais, nada seria realizado aqui", disse Francis Onstad, membro da tribo blackfeet, em Montana, que está trabalhando para iniciar um programa de apoio a vítimas de violência sexual. Ela espera que um dia seja possível construir um abrigo para vítimas na reserva. "Tudo o que fazemos precisa vir das verbas federais, porque a tribo não dispõe de recursos para financiar esse tipo de programa."
Não só a probabilidade de que as mulheres indígenas nos EUA sofram agressão sexual é maior do que a de qualquer outro grupo como sua chance de serem perseguidas é duas vezes maior do que a média nacional. E a probabilidade de que sofram agressão física de outra ordem também é maior. Em 9 de cada 10 casos, os agressores são homens não-indígenas, de acordo com números divulgados pelo grupo de combate à violência contra a mulher do Congresso Nacional Indígena dos EUA.
"As mulheres indígenas não são honradas por esse país", diz Juana Majel-Dixon, membro da tribo pauma, em San Diego, e participante do grupo de trabalho. "Se isso estivesse acontecendo com mulheres não-indígenas, a nação se levantaria para deter a violência."
Álcool, abuso de drogas, desemprego e pobreza estão entre as principais razões de violência nas reservas, dizem os ativistas. Eles também citam vestígios de colonialismo para explicar porque tantos homens não-indígenas pratiquem abusos contra as indígenas americanas.
"Esse não era um problema em nossas sociedades, tradicionalmente", diz Karen Artichoker, do Sacred Circle, um centro nacional de recursos para as mulheres indígenas americanas em Rapid City, Dakota do Sul.
Os esforços de repressão negligentes, de parte das autoridades das reservas e do governo federal, reforçam a impressão, entre os agressores, de que podem atacar mulheres indígenas sem quaisquer conseqüências, segundo os ativistas.
Devido ao relacionamento especial entre as tribos e o governo federal, só funcionários federais podem acusar não-indígenas por crimes cometidos nas reservas. E uma lei federal proíbe governos tribais de sentenciar indígenas norte-americanos a penas de prisão superiores a um ano.
As mulheres indígenas americanas também precisam enfrentar um conjunto único de obstáculos que as impede de buscar a assistência de que precisam, dizem especialistas em saúde da mulher. Muitas vivem em comunidades rurais, sem acesso a automóveis e telefones. Elas temem represálias dos parentes dos agressores, caso os denunciem. E muitas são tão pobres que acreditam não poder deixar seus parceiros, apesar dos abusos.
Iyotte não recebeu muita assistência depois de ser estuprada, mais de uma década atrás. Hoje, um programa em sua reserva oferece sessões semanais de aconselhamento para vítimas de estupro, uma linha de assistência telefônica e existe um grupo de ativistas contra a agressão sexual. Há também um alojamento para vítimas da violência.
Esse tipo de serviço, dizem os ativistas, pode desempenhar papel crucial na ajuda a mulheres indígenas agredidas e na redução da violência em suas comunidades. "Acreditamos que as respostas estejam nas nossas culturas", diz Artichoker.

Tradução de Paulo Migliacci


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