São Paulo, quarta-feira, 10 de outubro de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Risco de ataque químico cria pânico adicional

RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL

Mesmo sem disparar um míssil ou jogar um avião de passageiros contra um alvo, os terroristas -ou mesmo pessoas querendo fazer uma brincadeira de péssimo gosto- já conseguiram criar um pânico adicional: a possibilidade de um ataque com armas químicas ou biológicas contra os Estados Unidos ou seus aliados.
O risco existe faz anos, como todo risco de atentado terrorista em uma sociedade moderna, mas está sendo exagerado agora, por motivos compreensíveis. O que mais poderiam fazer os autores dos atentados de 11 de setembro?
Quanto mais complexa uma sociedade, maiores e mais vulneráveis são os alvos potenciais para quem quiser prejudicá-la -como reservatórios de água para milhares ou mesmo milhões de pessoas, mercados repletos de alimentos variados ou estações de trem e aeroportos.
Os atentados em Nova York e Washington fizeram milhares de vítimas. Mas conseguir o mesmo impacto com armas químicas ou biológicas ainda está fora do alcance de qualquer organização não governamental, e mesmo dos governos considerados "delinquentes" pelos EUA.
Mesmo sem conseguir matar em grande escala, atentados menores podem causar pânico desproporcional, pois os agentes da contaminação biológica -e mesmo da química, em certos casos- são praticamente invisíveis.
Basta ver o que aconteceu com um grupo terrorista que gastou milhões de dólares com o objetivo de provocar milhares de mortes, mas só matou 12 pessoas. Foi o caso dos japoneses da seita Aum Shinrikyo, que fizeram um atentado no metrô de Tóquio em 1995.
Os terroristas japoneses conseguiram produzir o gás sarin, um agente de guerra química relativamente sofisticado -trata-se de uma substância perigosa, que age paralisando o sistema nervoso, interrompendo a respiração e matando rapidamente.
Mas o método de disseminação envolveu colocar o sarin em sacos plásticos e furá-los com a ponta de guarda-chuvas.
Houve centenas de pessoas afetadas. Mas matar 12 pessoas é bem mais fácil que matar 12 mil.
"Dois fatores atrapalham a possibilidade de manufaturar agentes químicos com a finalidade de ataques maciços. Primeiramente, as reações químicas envolvidas com a produção dos agentes são perigosas: os produtos químicos precursores podem ser voláteis e corrosivos, e pequenos erros no processamento podem ser fatais", diz Amy Smithson, especialista em guerra química e biológica do Henry Stimson Center, um instituto de pesquisa em Washington.
E, em segundo lugar, diz ela, o perigo para o fabricante aumenta na proporção da quantidade da substância que se quer usar -perigo inclusive de detecção pelo governo dos EUA.
Para matar 10 mil pessoas com gás sarin seria preciso ter algo como duas toneladas do gás, segundo estimativas do Departamento de Defesa americano.
As mesmas proporções valem para armas biológicas. Para matar em escala maciça, seria preciso um esforço maciço de produção e disseminação de bactérias, vírus ou toxinas.
Matar aos milhares com essas armas não seria fundamental, do ponto de vista dos terroristas. Já foi provado que aviões-bomba podem fazer isso de modo satisfatório.
Mas armas químicas e biológicas têm a inestimável vantagem de provocarem pânico com mais facilidade. Micróbios e mesmo gases neurotóxicos são invisíveis e assustadores.
Mesmo sem ameaças reais, milhares de pessoas nos EUA e em Israel usaram máscaras protetoras durante a última crise do gênero, a Guerra do Golfo em 1991.
Há armas químicas que matam com apenas uma gota tocando a pele; certas bactérias ou toxinas de guerra biológica matam em poucos dias se não houver tratamento a tempo com os melhores antibióticos disponíveis.
O caso do antraz é particularmente significativo. Inalados, seus esporos são letais. Um comitê da Organização Mundial de Saúde calculou em 1970 que um avião que lançasse 50 kg de esporos de antraz sobre uma cidade com população de 5 milhões de pessoas provocaria 250 mil vítimas, das quais 100 mil morreriam sem tratamento. O último caso de antraz por inalação nos EUA tinha sido reportado em 1978.
Houve em Israel em 1991 quem, com medo disso, morresse de ataque do coração. O pânico também é uma arma biológica eficaz.


Texto Anterior: Medo: Homem é detido por jogar líquido em metrô nos EUA
Próximo Texto: FBI admite uso criminoso de antraz na Flórida
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.