São Paulo, quarta-feira, 10 de outubro de 2001

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FBI admite uso criminoso de antraz na Flórida

SÉRGIO DÁVILA
DE NOVA YORK

Investigadores do FBI (polícia federal dos EUA) afirmaram que a bactéria antraz que causou uma morte na Flórida foi produzida em laboratório, o que poderia indicar um ato criminoso, segundo a rede de TV ABC. Mas os investigadores acham que, por parecer ser um caso isolado, não deve se tratar de terrorismo.
Desde anteontem, quando o FBI passou a investigar a ligação com o terror de dois casos de antraz na Flórida, os estoques do antibiótico capaz de deter a bactéria sumiram das farmácias. Além disso, hospitais relatam que o medo de um atentado biológico os levou a receber um número recorde de pedidos de vacina.
Mas a cura pode ser quase tão perigosa quanto a doença. Pelo menos é o que afirma Ronda Breneman, 25, que mora em Fort Stewart, no Estado da Geórgia. Ronda foi piloto da Força Aérea norte-americana até 1999. Naquele ano, tomou três doses de vacina contra o antraz, como parte das medidas de segurança da aeronáutica.
Desde então, ela parou de menstruar, perdeu 20 quilos e sente náusea e dores de estômago. Um de seus amigos, também vacinado, teve lupus. Outro desenvolveu anemia profunda e morreu, diz ela. O Pentágono nega que a vacina tenha efeitos colaterais a longo prazo e afirma não ter conhecimento de fatalidades.
O fato é que, desde os primeiros relatos de militares que foram vacinados e sofreram reação, muitos soldados se recusaram a tomar a vacina obrigatória e tiveram de abandonar as Forças Armadas. Isso não impediu que nos últimos três dias pelo menos mil pessoas ligassem para um dos fabricantes da vacina.
Em vão. Por lei, o líquido só pode ser fornecido para hospitais, e uma vacinação maciça está totalmente fora dos planos do governo. "Por enquanto, não há a menor evidência de que tenha havido crime nos casos da Flórida", disse Paul Bresson, porta-voz da polícia federal norte-americana.
Mas a preocupação continua, por parte do FBI e da Casa Branca. "Vamos seguir investigando e informando sobre tudo o que descobrirmos", disse o porta-voz do governo, Ari Fleischer. "Mas é importante salientarmos que falsas ameaças não serão incomuns."
Na semana passada, o fotógrafo Robert Stevens, 63, morreu contaminado pela bactéria. Anteontem, o encarregado de correspondência Ernesto Blanco, 73, foi internado com vestígios no nariz. Ambos trabalhavam na mesma redação, da empresa de revistas American Media, em Boca Raum teclado com traços de antraz.
O FBI negou que um homem internado numa cidade da Virgínia com sintomas da doença seja vítima do antraz. A pessoa, não-identificada, teria trabalhado numa das revistas da empresa.
Especialistas acham pouco provável que a contaminação de duas pessoas se trate de coincidência. Mortal em 90% dos casos e muito difícil de diagnosticar quando ainda dá para ser combatido, o antraz é uma arma biológica quase perfeita.
Mas a bactéria que causa o antraz pode formar esporos, que sobrevivem quando triturados, desidratados, enterrados ou pulverizados, tornando-se ativos novamente quando encontram ambiente quente e úmido.
Esses esporos podem ser borrifados por um avião usado em plantações ou por um aerossol caseiro, o que o torna passível de ser usado num atentado. Há pelo menos 17 países com armas biológicas, segundo a Associação Médica Americana (AMA), entre eles o Iraque. O antraz não é contagioso, e os EUA contam com 18 casos nos últimos 100 anos.
Uma das hipóteses com que o FBI trabalha agora é a de que a bactéria tenha chegado à redação por correio. Segundo funcionários da empresa, a redação recebeu recentemente uma carta de amor endereçada à cantora Jennifer Lopez. Dentro, havia um pó não identificado e uma estrela de Davi. O envelope teria sido manuseado por Stevens e Blanco.
A outra partiu de um e-mail enviado por um ex-estagiário da empresa quando foi demitido. "Eu deixei uma surpresa para vocês lembrarem sempre de mim", dizia a mensagem.
O autor foi encontrado pela polícia e negou qualquer ligação com o caso.
A American Media edita revistas sensacionalistas como "The Sun", "National Enquirer", "Globe" e Star". Todas publicaram reportagens sobre Bin Laden e o Taleban. Uma delas levava a sério o boato de que o terrorista teria órgãos sexuais subdesenvolvidos.


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