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RELIGIÃO
Medida, criticada por muçulmanos, visa proteger secularidade na rede pública e exclui também solidéus e crucifixos "grandes"
França veta uso de véu islâmico na escola
DA REDAÇÃO
A Assembléia Nacional (a Câmara Baixa do Parlamento francês) aprovou ontem, com 494 votos a favor e 36 contra, uma lei que
proíbe estudantes de usarem peças de vestuário, como véus islâmicos ou outros símbolos religiosos, nas escolas públicas do país.
A proibição inclui solidéus judaicos e crucifixos cristãos "grandes", mas tem como principal objetivo impedir que alunas muçulmanas usem véus na rede pública.
Segundo a Lei da Laicidade,
"roupas e signos que conspicuamente revelem a afiliação religiosa dos estudantes estão proibidos". A nova regra -que deve ser
confirmada pelo Senado- entrará em vigor em setembro (início
do ano letivo) e não vale para escolas privadas.
Desde 1989, quando duas jovens
muçulmanas foram expulsas da
escola em que estudavam porque
se negaram a abrir mão do véu, a
polêmica dos véus divide a França. Nos últimos anos, outras alunas foram rejeitadas ou expulsas.
O governo argumenta que a lei é
necessária para proteger a laicidade do Estado francês e impedir
que o fundamentalismo islâmico
ganhe força nas escolas.
A lei também proíbe que se
questione a ocorrência do Holocausto durante aulas de história e
que alunos rejeitem assistir a aulas de reprodução sexual e educação física por motivos religiosos.
A punição poderá variar de um
simples aviso à suspensão temporária ou mesmo expulsão.
Nos últimos anos, professores
têm relatado problemas crescentes com estudantes muçulmanos
que interrompem aulas de história para negar o extermínio dos
judeus pelos nazistas ou boicotam
aulas sobre reprodução humana e
de educação física.
A lei "impedirá que a sala de aula se divida entre comunidades religiosas militantes", disse o ministro da Educação, Luc Ferry. Segundo ele, o sistema público tem
mostrado "um espetacular crescimento do racismo e do anti-semitismo nos últimos três anos".
A França tem as maiores comunidades islâmica (ao menos 5 milhões) e judaica (de 600 mil a 700
mil) da Europa.
A nova lei, apoiada pela maioria
da população, que tem uma forte
tradição secular e considera o véu
uma forma de opressão das mulheres, provocou críticas de muçulmanos na França e no mundo.
Também houve críticas por
parte de autoridades católicas, inclusive do papa João Paulo 2º.
"Em vez de combater o radicalismo, a lei o encorajará", disse o
sociólogo Farhad Khosrokhavar,
autor de "O Véu e a República".
Mas também há vozes favoráveis entre os muçulmanos. "Cada
um tem o direito de praticar sua
religião em casa. Se alguém quiser
usar véu fora de casa, tudo bem,
mas não em uma escola secular",
diz o marroquino Telly Naar, 65,
há 40 anos na França.
A votação causou protestos
diante de embaixadas da França
no Oriente Médio e críticas de líderes religiosos da região.
Segundo o xeque Abdel Aziz al
Cheikh, o maior líder religioso da
Arábia Saudita, o fato de a lei "se
imiscuir no assunto constitui uma
violação dos direitos humanos
tão defendidos pela França".
Em carta ao presidente Jacques
Chirac (favorável ao projeto), o
xeque Ahmad Kaftaro, da Síria,
disse que "a nação muçulmana
considera o véu um dos fundamentos da religião".
Já o xeque Mohammed Sayyed
Tantaui, líder da mesquita Al
Azhar, que fica no Cairo e é referência no mundo islâmico, disse
que a França tem o direito de promulgar suas leis e que os muçulmanos que vivem no país devem
aceitar os textos em vigor.
Nos EUA, 47 membros do Congresso enviaram carta ao embaixador francês: "A lei ameaça os
direitos religiosos das crianças
francesas ao forçá-las a escolher
entre a escola e práticas religiosas
que são centrais em seus valores".
A nova lei poderá ser contestada
sob o argumento de que a Constituição protege a liberdade de expressão das crenças religiosas. Em
última instância, poderá parar na
Corte Européia de Direitos Humanos, em Estrasburgo.
Com agências internacionais
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