São Paulo, Domingo, 11 de Julho de 1999
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VIDAS INVESTIGADAS
Caso Lewinsky leva eleitores a se informar sobre o passado dos presidenciáveis
Especialista prevê devassa inédita

de Washington

Os candidatos à sucessão do presidente Bill Clinton deverão ter suas vidas privadas devassadas numa intensidade sem precedentes na política norte-americana.
Elas serão reconstituídas pela mídia e pelos adversários desde o dia em que nasceram até o momento final das eleições, em novembro de 2000.
Segundo Stephen Hess, pesquisador de política norte-americana do Instituto Brookings, o processo de impeachment contra Clinton aumentou a demanda dos eleitores por informações sobre o caráter oculto dos candidatos. Ágil, a mídia deverá procurar suprir essa demanda.
"Clinton foi absolvido pela população, mas o escândalo deixou traumas. O presidente perdeu o sexto ano de seu governo se defendendo. A população gosta do presidente, mas não quer mais correr riscos."
Hess assessorou o presidente Richard Nixon, derrubado pelo escândalo de Watergate em 1974. Ele escreveu 20 livros sobre a relação da mídia com candidatos e presidentes. (MA)

Folha - Estamos a 17 meses das eleições à Presidência dos EUA, e a mídia já investiga a vida dos pretendentes ao cargo como se estivéssemos às vésperas do pleito. O que está acontecendo?
Stephen Hess -
A campanha começou cedo demais. Já existe uma polarização entre os pré-candidatos George W. Bush (republicano) e Al Gore (democrata). Isso antecipou o trabalho da mídia. Como resultado, os dois candidatos estarão expostos por muito mais tempo. Muita coisa deverá vir à tona.

Folha - Qual deverá ser o foco das investigações?
Hess -
A busca pelos traços de caráter dos pretendentes. Depois do escândalo Clinton, os eleitores passaram a dar mais importância ao assunto.

Folha - Caráter na vida privada ou na vida pública?
Hess -
Uso caráter como uma palavra fria para definir como os candidatos lidam com os dez mandamentos. Em tese, podem ser as duas coisas. Mas, depois de Clinton, muita ênfase será dada à vida privada dos candidatos: casamento, mulheres, vícios, dinheiro.

Folha - Aumentou o puritanismo da população?
Hess -
Não. O eleitorado não é tão puritano quanto parece. Sabíamos, por exemplo, que Clinton era do jeito que é antes de o elegermos. Depois disso, foram os eleitores que o seguraram no cargo durante o processo de impeachment.

Folha - Então, por que a caça à vida privada dos pré-candidatos?
Hess -
Por pragmatismo. O escândalo destruiu o sexto ano da Presidência de Clinton. A mídia acha que isso preocupa as pessoas.

Folha - Quem é o candidato com o passado mais frágil?
Hess -
George W. Bush parece ter tido uma vida mais desregrada. Com Gore, tudo parece ter sido perfeito. Mas isso não significa muita coisa.

Folha - Por quê?
Hess -
Problemas também serão levantados contra Gore, embora de outra espécie. Ele deverá ser questionado sobre o financiamento de campanhas passadas e sobre o uso do cargo para a obtenção de fundos na campanha presidencial de 1996.

Folha - Mas isso parece ser assunto velho...
Hess -
Aí está a esperteza de Bush, o rival de Gore. Ele foi sábio o suficiente para antecipar ao público que, quando jovem, frequentava festas pouco comportadas e levava uma vida excessivamente agitada, especialmente no trato com a bebida. Agora, ele pode dizer: "Eu era assim, frequentava festas e bebia bastante. Mas, desde que me casei, isso tudo acabou. Vivo uma vida limpa". Ele neutralizou possíveis denúncias e transformou algo que ninguém conhecia num assunto velho.


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