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Execução gera poucos protestos,
a favor e contra, em Terre Haute
CONTARDO CALLIGARIS
ENVIADO ESPECIAL A TERRE HAUTE
A quermesse prevista não aconteceu, por falta de participantes.
Os manifestantes contra a pena de
morte foram pouco mais de cem,
embora de muitos Estados -do
Alasca à Flórida. Desfilaram na
tarde de anteontem.
Um cartaz dizia: "Jesus Cristo
foi uma vítima da pena de morte"
-suficiente para os cristãos tomarem partido. À noite, os abolicionistas passaram por detectores
de metais e foram para uma área
do gramado da prisão.
Quando cheguei, às seis da manhã de ontem (hora local), estavam sentados em círculo, cada
um com uma vela, silenciosos.
Durante a execução, entoaram, de
mãos dadas, o hino dos anos 60,
"We Shall Overcome".
Os manifestantes a favor da pena de morte eram um punhado,
quase todos locais. Pergunto a
Peggy Harris, 26, estudante de enfermagem, de Terre Haute, para o
quê ela se manifesta, pois
McVeigh será executado. Responde: "A pena de morte deveria
ser brutal. Ele nem vai sentir a injeção. Que usem a cadeira elétrica".
Russell Braun, 21, soldado da
Guarda Nacional, também local,
exibe o cartaz: "Tchau, tchau, assassino de bebês". Pensa como
Peggy. Ambos são brancos de
classe média baixa e são as pessoas mais próximas de McVeigh
por origem e cultura. Nenhuma
contradição: McVeigh, se pudesse
estar aqui, também faria manifestação a favor da pena de morte.
Duas horas depois da execução,
houve a conferência de imprensa
de três representantes das vítimas
de Oklahoma City que presenciaram diretamente a morte de
McVeigh: o pai de uma vítima,
uma mulher que escapou ilesa e
um militar que perdeu oito companheiros.
Alguém perguntou o que eles
sentiram olhando McVeigh morrer. Responderam num crescendo. O pai: "Foi um alívio". O soldado: "Ficamos felizes". A mulher: "Estou em júbilo". Esse encontro com um ódio que resistiu
ao espetáculo do suplício foi o
momento mais violento da manhã.
O enigma McVeigh
Para o próximo dia 19 de junho
está prevista aqui a execução de
Juan Garza, traficante e assassino.
Não haverá nem um décimo do
interesse suscitado por McVeigh.
A diferença não se explica pela
magnitude do crime. McVeigh
polariza a atenção dos americanos porque matou por idéias. Ele
se apresentou como um "político" que defenderia valores americanos essenciais.
Sua morte deixa o enigma intacto: ele morreu sem desespero,
convencido de ser um soldado
vencedor (sua vida por 168 inimigos) e de ter lutado com táticas tão
banais quanto bombardeios de
guerra.
Quando foi aberta a cortina, ele
olhou nos olhos cada testemunha
da imprensa, seus convidados e
os representantes do governo. Só
não pôde cruzar olhares com os
representantes das vítimas por
causa do vidro espelhado.
Poucos apareceram para manifestar apóio às idéias libertárias de
McVeigh.
Wayne, 43, de Hamilton, Indiana, trazia o cartaz em que se lia
"Lembre-se de Waco" (o lugar no
Texas onde, em 1993, os agentes
federais invadiram um complexo
da seita Ramo Davidiano provocando a morte de 82 pessoas). No
seu ver, muitos outros queriam
vir, mas "estavam com medo dos
federais". Ele não pedia que
McVeigh vivesse: "McVeigh deve
pagar".
A afirmação de Chuck, 56, de
Dayton, Ohio, explica melhor:
"Concordo com todas as frustrações de McVeigh, mas reprovo a
tática. Boas idéias, alvo errado. E
não sou contra a pena de morte".
Para Shannon, 35, de Louisville,
Kentucky, as idéias de McVeigh
não morrerão com ele: "As milícias, por exemplo, não diminuíram desde Oklahoma, só se tornaram clandestinas".
Ele expõe uma das teorias conspirativas sobre o ato de McVeigh:
a idéia de que houvesse, atrás dele,
um agente provocador infiltrado
-a bomba justificaria a repressão das milícias. O fantasma de
McVeigh não sairá de cena tão cedo.
Descansando num parque, converso com um veterano em cadeira de rodas. Sabendo de minha
formação psi, pergunta: "Tinha
algo errado com a cabeça de
McVeigh?". Respondo que não
precisa: o erro mais grave, sobretudo quando a gente tem idéias, é
circular só com pessoas que concordam conosco. Meu interlocutor diz imediatamente que concorda. Concluímos que, então, era
melhor a gente se separar logo.
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