São Paulo, domingo, 12 de julho de 1998

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LIMPANDO O PASSADO
País, que recebeu diversos refugiados do regime nazista, adota medidas para recuperar imagem
Argentina intensifica ação antinazista

AUGUSTO GAZIR
de Buenos Aires

A Argentina desenvolve um conjunto de ações para passar a limpo a relação do país com a Alemanha nazista e capturar os criminosos da Segunda Guerra Mundial (1939-45) que ainda vivem no país.
Nos últimos meses, o governo da Argentina tomou as seguintes medidas: 1) formação de uma rede internacional de informações para identificar criminosos de guerra; 2) criação da Ceana, comissão composta por pesquisadores para estudar a relação argentina com o Terceiro Reich; 3) criação de seção na Polícia Federal para investigar foragidos de guerra e grupos neonazistas; e 4) integração ao plano mundial para recuperar obras de arte roubadas pelos nazistas.
"O governo Carlos Menem está aproximando a Argentina dos EUA. Para isso, é necessário mudar a opinião pública estrangeira que pensa que tivemos ligações estreitas com o nazismo", disse o historiador Ignacio Klich, coordenador da Ceana.
De acordo com dados preliminares do órgão, passaram com certeza pelo país 120 criminosos vinculadas ao regime nazista. A Alemanha enviou à Ceana lista com 143 criminosos nazistas que teriam vindo para a Argentina.
Nas últimas décadas, das várias extradições de criminosos de guerra pedidas por países europeus, a Argentina autorizou quatro. Metade delas nos anos 90, durante o governo de Menem.
A Ceana representou a Argentina no acordo firmado por 39 países, entre eles o Brasil, para recuperar 220 mil obras de arte roubadas dos judeus pelos nazistas.
Essas obras, avaliadas entre US$ 90 bilhões e US$ 140 bilhões, podem estar distribuídas por famosos museus internacionais ou por coleções privadas. Elas serviriam para indenizar as vítimas do Holocausto.
Últimas consequências
"Queremos investigar tudo até as últimas consequências. Sempre tivemos a necessidade de esclarecer o passado. A Argentina não quer ser mais receptáculo de criminosos de guerra", afirmou Victor Ramos, presidente do Inadi (Instituto Nacional contra a Discriminação, a Xenofobia e o Racismo), órgão ligado ao governo.
Ramos acertou com os governos de Israel, Alemanha e EUA a troca constante de informações para identificar com mais rapidez criminosos de guerra que estejam em território argentino.
"Os EUA têm grande experiência nas identificações dos criminosos, pelo grande número de foragidos que recebeu. Os arquivos alemães são importantes para checarmos o passado dos suspeitos", disse Ramos.
Neonazistas
O Inadi firmou um convênio com a Polícia Federal para inibir a ação de grupos neonazistas. Em abril passado, três jovens neonazistas foram condenados a três anos de prisão por espancarem um jovem que acreditavam ser judeu.
No fim do julgamento, os pais dos garotos gritaram no tribunal ofensas anti-semitas.
"Esses grupos neonazistas ainda são desorganizados e sem recursos, mas nem por isso são menos perigosos", afirmou Ramos.
"Eles são incentivados pela presença na Argentina de criminosos da Segunda Guerra Mundial. Aí, podem estar as raízes desses skinheads", completou.
No país, há o Partido da Nova Ordem Social, ainda informal e desestruturado, que prega idéias fascistas. Na Internet, é possível encontrar páginas feitas por argentinos com o mesmo conteúdo.
"Os skinheads são como os barrabravas (violentos torcedores organizados argentinos de futebol) desses grupos", disse Ramos.



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