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PALESTINA ÓRFÃ
OS PALESTINOS
Legalmente, eleição presidencial deve ocorrer dentro de 60 dias, mas analistas não crêem que isso seja factível
Disputa pela liderança já começou
DO ENVIADO ESPECIAL A RAMALLAH
A sucessão de Iasser Arafat começou ontem mesmo, depois que
o secretário-geral da Presidência,
Tayeb Abdel Rahim disse em lágrimas: "Glória a você, nosso líder", a um punhado de jornalista
às 6h no portão da Muqata.
E conta pouco o fato de haver
um novo presidente constitucional palestino, Rawhi Fattouh. Sua
missão é dar um verniz institucional à sucessão, essencial para ganhar apoio internacional à ANP
(Autoridade Nacional Palestina).
A principal disputa começou a
se delinear na nomeação dos outros dois cargos da estrutura de
poder palestina -que Arafat acumulava com o de presidente da
ANP. O mais importante deles, o
de presidente da OLP (Organização para a Libertação da Palestina), ficou como previsto com
Mahmoud Abbas, o Abu Mazen.
Mas o jogo começou na escolha
para a chefia da Fatah, o movimento político-militar fundado
por Arafat em 1958 que tornou-se
a principal facção da OLP. O novo
líder será Farouk Kaddumi, um
antigo aliado de Arafat que ficou
exilado em Túnis quando o presidente morto ontem voltou para a
faixa de Gaza em 1994.
Kaddumi, ainda que aberto a
negociar com Israel, não aceitou
os termos dos acordos de Oslo. E
ontem declarou: "Resistência é o
caminho para chegar a um acordo político", disse do Cairo à TV
Al Manar, do grupo extremista libanês Hizbollah.
Formalmente, Fattouh deverá
esquentar a cadeira para o próximo presidente. Pela lei, deverá ser
realizada em 60 dias a eleição presidencial. A seu favor, há o fato de
ter havido em outubro um alistamento eleitoral nos territórios palestinos, visando um pleito municipal ainda não marcado.
E as facilidades acabam aí. Ninguém crê seriamente que o prazo
seja exeqüível. Um motivo central
é o fato de Israel manter 600 bloqueios militares só na Cisjordânia, o que inviabilizaria qualquer
campanha eleitoral.
Saeb Erekat, negociador palestino, disse que a chave para o sucesso da transição são "eleições".
Suas palavras podem ser lidas como sinal de desespero de uma ala
que acabou de perder o poder.
Mas não deixam de fazer sentido
do ponto de vista institucional.
O mais importante para a ANP,
segundo políticos ouvidos em Ramallah, já teria sido atingido.
Uma imagem definida pelo poderoso ministro Mohammed Dahlam como "transição, a mais
suave possível". Como poucos incidentes foram registrados até a
noite de ontem, parece que o plano sobreviveu seu primeiro dia.
O conselheiro de segurança nacional palestino, Jibril Rajoub,
disse à Al Jazira que "a era Arafat
acabou" e que "a próxima fase deve ser uma de instituições e leis".
Com isso, ele resume algo que já
é perceptível: sem líder forte, a
ANP terá de se estabelecer como
instituição. Muitos duvidam que
isso seja possível, em especial do
lado israelense, que, além disso,
precisa de um nome para apontar
o dedo acusador em caso de fracasso em negociações. "O momento é de dividir poderes, separar o Estado palestino das instituições políticas", disse à Folha Ahmad Anan, membro da Fatah.
No xadrez, parece ter ficado no
meio do caminho Ahmed Korei, o
Abu Ala. Ele segue como premiê
palestino, mas há dúvidas sobre
sua sobrevivência política quando
houver um novo presidente.
Às 10h, um panfleto revelador
foi colado no muro da Muqata.
Mostrava Arafat, mas com uma
diferença: o líder morto segurava
uma foto de Marwan Barghouti.
Trata-se de um dos mais populares líderes do Fatah, tendo coordenado a primeira Intifada (1987-1993). Ele cumpre diversas penas
de prisão perpétua em Jericó, sob
custódia israelense. O que não
significa muito: libertações acertadas em trocas de presos são comuns, e muitos apostam que Israel pode colocar suas fichas em
um Barghouti amaciado como
candidato a presidente.
Por fim, há os grupos que praticam terror contra civis, principalmente Hamas e Jihad Islâmico.
Ontem, seus líderes deram apoio
à "transição suave", e sabe-se que
o Hamas já foi contatado para tomar parte do eventual processo
eleitoral. Vindos de áreas pobres
de Gaza, porém, esses grupos são
voláteis. Um atentado tornaria as
perspectivas mais indefinidas do
que já são.
(IGOR GIELOW)
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