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Apoio militar evaporou com apoio popular
DA REDAÇÃO
Os militares, com os quais o coronel da reserva Hugo Chávez
contava para tentar se sustentar
no poder, mesmo com a brutal
perda de apoio popular verificada
ao longo dos últimos meses, acabaram se tornando o principal fator que possibilitou sua queda, na
madrugada de ontem.
A insatisfação nos quartéis já
era pública desde o início do ano,
quando começaram a aparecer os
primeiros casos de oficiais que se
rebelaram publicamente contra o
presidente, e ficou patente a partir
da tarde de ontem, quando oficiais das mais altas patentes passaram a apoiar a rebelião.
"Os militares venezuelanos
sempre foram favoráveis à institucionalidade e não dariam um
golpe para derrubar o presidente,
ainda que o mal-estar fosse evidente. Mas a partir do momento
em que a base de sustentação popular se esfarelou e houve a impopular repressão contra a manifestação em frente ao palácio presidencial, eles se sentiram livres para abandoná-lo de vez", disse à
Folha um general da reserva, que
pediu para não ser identificado.
O relativo apoio que Chávez tinha entre os militares após ser
eleito, em 1998, evaporou com sua
aproximação cada vez maior com
o ditador cubano, Fidel Castro, e
com suas supostas relações, nunca confirmadas, com os guerrilheiros colombianos das Farc
(Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia). O tradicional
antiesquerdismo das Forças Armadas teve peso nessa reação.
Também não era visto com
bons olhos nos ambientes militares o enfrentamento de Chávez
com instituições como os meios
de comunicação, a Igreja Católica
e os sindicatos patronais e de trabalhadores.
Além disso, muitos oficiais adversários de Chávez foram preteridos em promoções ou levados
compulsoriamente à reserva.
Para a analista política Isabel
Bacalao Romer, professora da Escola Superior de Guerra Naval,
Chávez foi derrotado pelos mesmos militares que o derrotaram
em 1992, quando tentou dar um
golpe contra o presidente Carlos
Andrés Pérez. "Chávez mantinha
seus aliados, muitos deles companheiros de golpe, em postos-chave de comando, mas sua influência sobre as tropas era bastante
minoritária", disse.
É praticamente consenso que a
queda de Chávez foi possibilitada
pela ação dos militares, mas que
ela não foi o seu estopim. "Não foi
um golpe das Forças Armadas
imposto ao povo, mas uma manifestação popular contra o governo que teve o apoio das Forças Armadas", afirma o analista político
Alfredo Keller.
O apoio popular a Chávez, que
chegou a cerca de 90% na época
de sua posse para o primeiro
mandato, no início de 1999, caiu
para menos de 30%, segundo as
últimas pesquisas, em razão principalmente da sua incapacidade
em cumprir com suas principais
promessas eleitorais -o combate
à corrupção e à pobreza.
Sem essa base, Chávez perdeu o
que restava de apoio entre seus
pares militares. "É natural que, assim como evapora o apoio popular, também evapora o apoio militar", afirma Isabel Bacalao.
Para o analista Teodoro Petkoff,
diretor do jornal "Tal Cual", a
queda de Chávez pode ser considerada um contragolpe dos militares em reação a um possível autogolpe, a partir do fechamento
das TVs privadas e da ordem para
reprimir a multidão que protestava contra ele em frente ao palácio
presidencial.
Conflitos políticos
Ao mesmo tempo que via seu
apoio popular e entre os militares
escassear, Chávez comprou brigas que acabaram lhe custando
também a perda de parte do poder político.
Com o enfrentamento a antigos
aliados, ele perdeu o apoio de aliados importantes, como o do prefeito de Caracas, Alfredo Peña,
transformado em um de seus
principais e mais populares críticos, e de Luiz Miquilena, considerado seu mentor intelectual.
A saída de Miquilena, então ministro do Interior e Justiça, do governo em janeiro deste ano derrubou a maioria de Chávez na Assembléia Nacional para pouco
mais de 50%. Após as eleições legislativas de julho de 2000, o
apoio a Chávez na Assembléia
chegava a 75%.
Em maio de 2001, o abandono
da coalizão governista pelo MAS
(Movimento ao Socialismo) já havia quitado de Chávez o apoio de
15% do Legislativo. Com uma
maioria cada vez mais precária, o
governo perdeu pela primeira vez
uma votação no Legislativo há
duas semanas.
(RW)
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