|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Brasil defende
compensação
não-financeira
DA REDAÇÃO
O Brasil crê que os descendentes de escravos que aqui
vivem tenham direito à reparação, porém, de acordo
com o diplomata Frederico
Meyer -que se ocupa do tema na missão brasileira em
Genebra-, trata-se de uma
"indenização diferente",
não-financeira e endógena.
Ou seja, Brasília defende a
implementação de políticas
nacionais que favoreçam as
comunidades em que vivem
descendentes de escravos.
"O Brasil defende uma
postura positiva na qual políticas nacionais visem a
compensar o erro histórico
que constituiu a escravidão.
Em princípio, no entanto, o
país não quer criar um sistema de cotas, pois ele gera
uma forma de racismo inverso", explicou Meyer à Folha, de Genebra.
Assim, diferentemente da
ação afirmativa norte-americana, que prevê o estabelecimento de cotas e metas
concretas que favoreçam
minorias raciais, Brasília
pretende privilegiar políticas
públicas específicas, que ataquem problemas que atingem os negros.
"Um exemplo desse tipo
de política seria, na área da
saúde, o estabelecimento de
um programa de combate à
anemia falciforme, que é um
problema específico da comunidade negra (doença
hereditária de incidência
quase exclusiva em negros e
seus descendentes)", afirmou Alexandre Porto, funcionário da Secretaria de Estado dos Direitos Humanos
do Ministério da Justiça.
Brasília já reconhece que a
"democracia racial brasileira" não passa de um mito.
"Em 1996, num relatório enviado à Comissão para Eliminação da Discriminação
Racial da ONU, o presidente
Fernando Henrique Cardoso admitiu oficialmente a
existência de racismo no
país", esclareceu Porto.
Sociedade civil
A política brasileira pretende envolver a sociedade
civil no debate e, mais do
que isso, dar a ela a possibilidade de participar ativamente do esforço de reparação aos afrodescendentes.
"Por exemplo, uma organização não-governamental,
como a Fundação Palmares,
que é reconhecidamente séria, poderia receber uma
verba do Itamaraty para ajudar a preparar candidatos
negros para o concurso do
Instituto Rio Branco (que
forma os diplomatas brasileiros)", sugeriu Meyer.
O governo brasileiro também é favorável à reparação
histórico-científica no que
concerne à escravidão e ao
tráfico negreiro.
Na reunião preparatória
de Santiago para a cúpula de
Durban (África do Sul), que
reuniu países do continente
americano e ocorreu em dezembro passado, o Brasil
propôs a realização de uma
revisão de textos didáticos e
currículos universitários para evitar referências que possam ser consideradas de cunho racista ou que não reflitam a realidade do que foi o
período escravagista de nossa história.
Resta, portanto, torcer para que a retórica oficial se
aproxime da realidade. O
geógrafo Milton Santos, professor emérito da Universidade de São Paulo e figura de
ponta da comunidade negra
brasileira, mostrou-se cético. "A política oficial do Brasil no que diz respeito aos
negros é de uma grande hipocrisia, pois não vejo nada
acontecer na prática", declarou Santos.
(MSM)
Texto Anterior: Direitos humanos: ONU discutirá indenização por escravidão Próximo Texto: Comentário: A globalização do ressentimento Índice
|