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Democrata corre risco ao exagerar na defesa de seus direitos
CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
ESPECIAL PARA A FOLHA, DE WASHINGTON
Esta semana, começou a aparecer, em alguns carros em Washington, um adesivo com os seguintes dizeres: "Richard Nixon
em 2000, ele era menos sacana do
que Al Gore". É claro que esse tipo
de propaganda só pode ser produto de um adversário político do
vice-presidente dos EUA.
Mas o simples fato de que o
mais odiado presidente do século
possa ser usado como modelo de
conduta política em comparação
com o candidato do Partido Democrata à eleição presidencial
deste ano dá uma boa noção do
risco político que Gore está correndo ao exagerar na defesa de
seus direitos, supostamente violados na votação de terça passada.
Não é só Nixon que serve como
exemplo para Gore. Na história
do país, nenhum candidato à Presidência derrotado por qualquer
margem e diante de qualquer evidência de fraude jamais contestou
na Justiça o resultado da eleição.
Eleição é mais ou menos como
futebol. O juiz pode errar e deixar
evidente que errou, diante da platéia e segundo a fita de vídeo. Ainda assim, o resultado do jogo vale.
Em 1960, Nixon perdeu para
John F. Kennedy. Havia provas de
que, no condado de Fannin, Texas, Estado sob o comando político do vice da chapa de Kennedy,
Lyndon Johnson, 4.895 eleitores
haviam depositado 6.238 votos. E
que, no 38º distrito eleitoral de
Illinois, na cidade de Chicago, liderada pelo prefeito Richard Daley, aliado de Kennedy, 43 pessoas
haviam votado 121 vezes depois
do fechamento das urnas.
Só dois exemplos de inúmeras
outras indicações de fraude. Kennedy ganhara os votos eleitorais
de Illinois por uma diferença de
menos de 10 mil votos; no Texas, a
vantagem também havia sido
apertada. Nixon ficou muito tentado a contestar na Justiça todos
os casos de suposta ilegalidade de
que havia tido conhecimento.
Mas não agiu assim. Claro que,
para a história, ele tentou aparentar sua melhor face. Earl Mazo, o
primeiro biógrafo de Nixon, diz
que ele tomou tal decisão para
não ferir os interesses do país.
Richard Reeves, biógrafo de
Kennedy, conta história diferente.
Nixon não teve do presidente
Dwight Eisenhower, de quem era
vice, apoio para realizar a pretendida contestação.
Além disso, Nixon sabia que as
chances de sucesso na Justiça de
uma ação contra o resultado eleitoral eram muito pequenas.
Mas Al Gore também sabe disso, e, com certeza, Bill Clinton, de
quem ele é vice, também não sairá
em sua defesa no caso de um processo judicial. O que, então, move
Gore? Alguns aliados políticos do
vice-presidente dizem que ele está
apenas dando uma satisfação a
seus cabos eleitorais e militantes,
que se esforçaram tanto por ele.
Outros acham que ele está sendo movido por puro sentimento
de vingança, pelo fato de George
W. Bush estar agindo de maneira
arrogante. Nenhuma das duas explicações parece convincente,
tendo em vista o fato de que Gore
é um animal político refinado,
que sabe conter os instintos humanos com rigor.
Gore pode estar querendo algo
mais, além de mostrar serviço para as bases. Talvez vender mais caro sua derrota; talvez forçar a indicação de alguns aliados para o
ministério de Bush, já que tantos
analistas recomendam ao presidente eleito -seja quem vier a
ser- a formar um governo de
união nacional para fechar as feridas da campanha.
O que é claro é que a história ensina a Gore que o melhor a fazer,
do ponto de vista do interesse da
nação e do seu próprio, é aceitar a
derrota de maneira elegante e se
capitalizar para o próximo pleito:
todos os candidatos que perderam em condições similares às
suas e se candidataram em seguida venceram a eleição.
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