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A VOLTA DO PROFESSOR
Em palestra, ex-presidente vê risco de ruína das instituições pós-2ª Guerra
FHC ataca ação "imperial" de Bush
DA REPORTAGEM LOCAL
O ex-presidente Fernando
Henrique Cardoso criticou ontem a "atitude imperial" dos
EUA e disse que uma eventual
guerra contra o Iraque não deve
ser entendida em função de interesses meramente econômicos. Segundo FHC, a posição
dos EUA pode ser caracterizada
como "pós-imperialista", no
sentido de que o governo Bush
teria "uma vontade de plasmar
o mundo a partir de valores absolutos: o bem e o mal".
"É arriscado fundamentar
ações a partir de valores últimos, absolutos. Não se pode dizer que o seu valor é bom e o outro é mau. Quem vai dizer o que
é bom e o que é mau? Os fundamentalistas islâmicos poderão
dizer que os Estados Unidos são
o mal. Não podemos adotar
uma posição maniqueísta, nem
de um lado nem de outro", disse
FHC, em aula magna dentro da
série "Grandes Cursos", da TV
Cultura, realizada no teatro
Franco Zampari, em São Paulo.
Foi o primeiro evento público
do qual participou FHC no Brasil desde que deixou a Presidência. De volta da Europa no último domingo, ele não fez ontem
nenhum comentário sobre assuntos internos do Brasil e não
respondeu a perguntas.
A aula, sob o título "A Crise
Internacional e o Multilateralismo", será exibida pela TV Cultura no próximo dia 24. Compareceram cerca de 250 pessoas,
entre elas o governador de São
Paulo, Geraldo Alckmin, e a ex-primeira-dama Ruth Cardoso.
Para FHC, é importante que as
relações internacionais tenham
uma "base moral", mas essa base não pode ser "maniqueísta" e
sim construída a partir de negociações nas instituições multilaterais, da colaboração entre os
Estados e do pluralismo.
Ele afirmou que o mundo vive, em virtude do impasse no
Conselho de Segurança da ONU
e da ameaça dos EUA de atacar
o Iraque mesmo sem o apoio
das Nações Unidas, uma "situação limite". "É importante evitar que haja um retrocesso em
todos os esforços das últimas
décadas de construção de instituições multilaterais, ainda que
elas sejam imperfeitas e frágeis."
"Ou marchamos para reforçar
essas instituições ou entraremos
num período prolongado de esfacelamento do multilateralismo", disse. Segundo o ex-presidente, não é apenas a ONU que
pode sair prejudicada se houver
uma ação unilateral (sem apoio
do Conselho de Segurança)
contra o Iraque, mas também
outras instâncias de cooperação
entre os países, como a União
Européia, a Otan (aliança militar ocidental liderada pelos
EUA) e até mesmo o Mercosul.
Para FHC, o problema do desarmamento do Iraque não é o
último que o mundo enfrentará
e é preciso preservar as instituições multilaterais. "Precisamos
avançar numa radicalização da
democracia", disse.
Ele evitou marcar uma posição sobre o que fazer em relação
ao Iraque. Segundo ele, seria
melhor "liquidar Saddam sem a
guerra", mas o fundamental é
buscar uma solução "através
dos mecanismos internacionais
de legitimação das ações".
FHC encerrou sua palestra dizendo que vê a possibilidade de
que a crise leve a uma renovação
da ONU e das demais instituições multilaterais. "Sempre
achei que seria preferível alterar
a ordem mundial a partir das
instituições financeiras, comerciais. Mas quem sabe não poderemos começar pelo lado político?", disse.
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