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"Considero-me uma sobrevivente', diz vítima
da Sucursal de Brasília
"Eu me considero uma sobrevivente e carrego todo o peso e toda
a carga disso, porque os militares
mataram sem nenhuma razão."
O depoimento é de Beatriz Castiglioni, que permaneceu grávida
em Campo de Maio por 17 dias em
abril de 1977.
Ela esteve junto de outras mulheres grávidas, todas presas em
galpão da instalação militar. Beatriz foi libertada dias antes do nascimento de seu filho, Fernando.
Os militares, segundo ela, disseram que haviam cometido um engano ao prendê-la.
"Quando soube que estavam
mortas, me perguntava como estou viva. Havia militado quatro
anos antes na Juventude Peronista
e, como eu, muitas ali não tinham
ativa participação política."
Beatriz conta que quando chegou ao Campo de Maio foi interrogada e insultada. "Eles disseram
que me arrebentariam depois do
nascimento do meu filho."
Ela, hoje psicóloga, afirma que a
única agressão física que sofreu foi
um golpe na cabeça, o que classifica como sorte.
"Conheci uma mulher grávida
que foi torturada terrivelmente.
Ela não podia beber água por causa da quantidade de choques elétricos que tomou."
O ex-marido de Beatriz, que foi
preso e libertado junto com ela, teve três costelas quebradas e foi
mordido por cachorros.
Os presos, segundo a psicóloga,
dormiam no chão e passavam boa
parte do tempo encapuzados e algemados. "Éramos chamados por
números. Fiquei com o 229."
"Quando fomos presos, nos informaram que o procedimento era
ilegal e que estávamos em uma
guerra suja."
Depois do regime militar, quando denunciou o ocorrido, Beatriz
soube que todas as mulheres grávidas que estavam com ela haviam
desaparecido. Segundo investigações de uma comissão formada
pelo novo governo democrático,
as mulheres tinham os filhos em
Campo de Maio, ficavam horas
com ele e depois eram executadas.
"Tiraram a identidade de um
monte de garotos para que não assimilassem as idéias dos pais.
Sabe o que é mais incrível? O fato
de deixarem testemunhas. Foi
uma mistura de soberba com certa
compaixão. Pensavam que nunca
ocorreria nada com eles."
(AG)
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