São Paulo, domingo, 14 de julho de 2002

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GUERRA SEM LIMITES

EUA geram confusão na imprensa sobre plano de ataque; estratégia seria levar Iraque a dar pretexto para ação

Com ameaças, Bush tenta arrastar Saddam à guerra

RUPERT CORNWELL
DO "THE INDEPENDENT", EM WASHINGTON

O governo de George W. Bush está tentando provar que uma guerra pode ser vencida só com ameaças. Quase nenhum dia acaba sem nova reportagem ou declaração sugerindo que um ataque americano -no fim deste ano ou no início de 2003- é uma certeza virtual.
A posição oficial foi descrita por Bush na segunda-feira. Os EUA estão comprometidos com "a mudança de regime" em Bagdá e usarão "todas as ferramentas à nossa disposição" para atingir esse objetivo, mas ele disse não ter tomado decisão final ou elaborado nenhum plano.
Ele descreveu o vazamento de planos de guerra detalhados do Pentágono ao "The New York Times" como obra de "alguém lá embaixo, no nível cinco".
Os vazamentos continuaram, primeiro em uma reportagem alegando que os EUA usariam bases aéreas jordanianas para lançar seus ataques -apesar de os jordanianos não terem sido informados e de todos os indícios serem os de que eles não dariam permissão se fossem consultados.
Depois, foi publicada outra reportagem no "USA Today" afirmando que estrategistas militares haviam "levantado a âncora" para uma invasão. Só seria preciso agora uma provocação do ditador iraquiano, Saddam Hussein, como invadir um vizinho ou atacar curdos ou xiitas iraquianos.
A implicação das revelações do "The New York Times" é que o "modelo afegão" para uma invasão do Iraque, envolvendo uma combinação de bombardeios, forças especiais e operações secretas da CIA (agência de inteligência), com a ajuda de uma insurreição interna, foi descartado. O projeto, intitulado Cent-Com Course for Action, dá ênfase a uma agressão avassaladora envolvendo 250 mil ou 300 mil soldados e ataque aéreo contra instalações de infra-estrutura iraquianas e locais onde haveria armas de destruição em massa.
Alguns analistas vêem as reportagens como parte de um processo para capturar Saddam em uma armadilha, forçando-o a uma medida drástica que daria a Washington o pretexto de que precisa. Por exemplo, boatos sobre agentes dos EUA e do Reino Unido promovendo a discórdia entre curdos e iraquianos poderiam levar Saddam a atacá-los -oferecendo, assim, uma justificativa. Essa estratégia explicaria por que os EUA são tão avessos a negociações sobre a volta de inspetores de armas da ONU ao Iraque.
Paul Wolfowitz, vice-secretário da Defesa e um dos principais proponentes de ações anti-Saddam, tem protelado abertamente as inspeções. Elas seriam incapazes de inspecionar qualquer coisa, ele insiste, enquanto as negociações permitiriam que Saddam ganhasse tempo.
Agora, Washington começa a se concentrar numa possível provocação que derrubaria qualquer obstáculo concebível: ligações entre o Iraque e a Al Qaeda apontando para o envolvimento de Bagdá em atos terroristas anteriores ao 11 de setembro, ou naquele dia.
A CIA e o Pentágono pareciam desdenhar de reportagens que diziam que Mohammed Atta, o líder dos sequestradores, tinha se encontrado com um agente secreto iraquiano em Praga no início de 2001. Mas os funcionários do governo estão reexaminando esse episódio, enquanto um desertor iraquiano alegou em um documentário na TV que havia visto o próprio Osama bin Laden em Bagdá em julho de 1998.
Qualquer uma das histórias, se confirmada, justificaria o argumento de Washington para derrubar Saddam -o de que, mesmo que não use armas químicas, nucleares ou biológicas, ele as disponibilizaria a terroristas.


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