São Paulo, terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

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ANÁLISE REVOLTA ÁRABE

Ondas emitidas pelo Egito varrem a região

Árabes parecem fascinados pela mensagem da praça Tahrir; seus governantes autocratas sentirão esse entusiasmo

DAVID GARDNER
DO "FINANCIAL TIMES"

A Revolução de Jasmim, na Tunísia, começou a demolir o Estado de segurança árabe e a opinião acomodada e perene de que as autocracias árabes, com seu esqueleto formado pelas Forças Armadas e um sistema nervoso composto por serviços de segurança, eram inatacáveis.
Já a Revolução do Nilo, no Egito, é assunto de magnitude muito diferente. Foi como se arremessasse um imenso rochedo ao lago estagnado do despotismo árabe, cujas ondas varrem a região.
Os insurgentes não só removeram Hosni Mubarak como reduziram o poder de todos os autocratas do mundo árabe. Mubarak claramente pensou que pudesse procrastinar. E o mesmo parece se aplicar à maioria dos governantes árabes cujas nações têm perfis socioeconômicos semelhantes ao do Egito.
Os governantes de Argélia, Iêmen e Bahrein, países instáveis que passaram por conflitos nos últimos anos, estão recorrendo à conhecida combinação de subornos e cassetetes, como fazia Mubarak.
O rei Abdullah, da Jordânia, país no qual os palestinos são maioria, reagiu aos protestos crescentes demitindo seu premiê. Mas os jordanianos conhecem o truque. O pai dele, o rei Hussein, teve 56 primeiros-ministros em 46 anos de reinado.
Os líderes das 36 tribos do país, a base do Exército e do domínio hashemita, acabam de escrever ao rei exigindo mudanças, incluindo a de que ele controle sua rainha, que é enxerida e palestina.
Na Síria, Bashar Assad reduziu as bases de seu regime a uma empreitada familiar ou de clã e abriu mão do auxílio de alguns dos camaradas de seu formidável pai, Hafez Assad, que serviam como contrapeso oriundo da maioria sunita da Síria para o controle do governo por integrantes da minoria allawita.
O regime de Assad tem pendor comprovado pelo uso da violência contra seus inimigos. Mas o mesmo poderia ser dito sobre o de Mubarak.
A gerontocracia governante da Arábia Saudita enfrenta dificuldades sucessórias e depende das lideranças religiosas reacionárias. O rei Abdullah tentou introduzir reformas, embora lentas. Mas seu mais provável sucessor, o príncipe Nayef, já falou em "manter pela espada o conquistado pela espada".
Depois do Egito, as reformas lentas e impostas de cima para baixo que alguns governantes árabes parecem dispostos a tolerar são manifestamente insuficientes para apaziguar as populações irrequietas de seus países.
Os árabes deixarão de ser simples espectadores na disputa de influência entre Irã, Turquia e Israel -e os israelenses não poderão mais depender de reis e generais para controlar a animosidade popular contra suas políticas em áreas como a Cisjordânia.
O Egito volta a ser importante; a liberdade está ao alcance do país, e a dignidade foi restaurada. Os árabes parecem fascinados pela mensagem da praça Tahrir. Seus governantes sentirão isso.


Tradução de PAULO MIGLIACCI


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