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São Paulo, terça-feira, 15 de abril de 2003

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Tropas chegam sem intérprete e são recebidas com desconfiança

LAURENT LOZANO
DA FRANCE PRESSE, EM TIKRIT

Quando uma moradora de Tikrit avança cautelosamente até a barreira de controle, levando uma criança nos braços, o soldado americano grita: "Para trás, para trás!". A mulher obedece. A cena é indicativa da desconfiança mútua que reina no reduto do ex-ditador Saddam Hussein ocupado pelas forças americanas.
Na praça central, ao pé da estátua equestre de Saddam, cercada por sete blindados americanos, o oficial que comanda o batalhão de reconhecimento explica que os quase 900 homens que chegaram à cidade durante a noite estão ali "para ajudar as pessoas".
Todos os soldados dizem estar aqui "em missão de paz" e parecem não ter consciência do alcance simbólico de sua "vitória". Mas é evidente que a comunicação entre os soldados e a população ainda não foi estabelecida. E aqueles que receberam ou viram as saudações e os abraços em Bagdá podem notar a diferença entre a situação na capital e o ambiente que reina nesta cidade situada 180 km ao norte. Para complicar as coisas, o oficial reconhece: "Infelizmente, não temos intérprete".
Todos os habitantes de Tikrit mantêm distância dos americanos ou são mantidos à distância. Dois iraquianos usando aventais brancos que caminham até a barreira de controle são advertidos. Entretanto, mesmo sem intérprete, os soldados acabam percebendo que são médicos e lhes dão um salvo-conduto para o hospital.
O trajeto até o centro de assistência é feito ao lado de uma coluna de blindados americanos.
De seu lado direito, os militares vigiam um local onde paramilitares fiéis a Saddam tinham seu quartel-general. Do lado esquerdo, os soldados cochilam ao sol diante dos veículos que vigiam a entrada monumental do palácio do ex-ditador. Situado ao final de uma entrada rodeada de palmeiras, ele é de um luxo extravagante, mas parece estar intacto. Quando chegamos mais perto, porém, podemos ver que foi destruído de dentro para fora. Os revestimentos de madeira e mármore foram arrebentados, e as grandes escadarias, quebradas. Mas a vista para o rio Tigre continua magnífica.
Ecoam ao longe algumas explosões, muito menores que as da noite. Alguns helicópteros continuam a sobrevoar a cidade.
No interior do palácio, que dá a impressão de nunca ter sido ocupado, as esculturas de madeira e o revestimento de ouro falso dos banheiros continuam ali -os saqueadores ainda não chegaram ao ponto do que fizeram seus colegas em Bagdá, Kirkuk e Basra.
Nem os moradores nem os americanos derrubaram a estátua de Saddam. Nem dispararam contra seus retratos. Ele está em todo lugar e lugar nenhum, e os moradores da cidade dizem que não o viram mais desde que a guerra começou, em 20 de março.


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