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São Paulo, quinta-feira, 15 de maio de 2003

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A LONGA NOITE ARGENTINA

Durante o dia, porém, cartazes no chão de comitê do candidato indicavam desânimo

Menemistas fiéis fizeram vigília em hotel

ELAINE COTTA
DE BUENOS AIRES

São 2h da madrugada de quarta-feira, e Maria Amati, 48, continua em frente ao hotel Presidente, em Buenos Aires, onde Carlos Menem passou o dia e a noite reunido com assessores para decidir se renunciaria ou não à disputa do segundo turno da eleição presidencial da Argentina.
Bandeira em mãos e vestindo uma camiseta que estampava: "Com Menem vencemos todos", Maria era apenas mais uma das centenas de pessoas que invadiram a calçada e fecharam a rua em frente ao hotel para pedir que Menem não abandonasse a candidatura.
"Menem não vai desistir. O povo só tem a ele. Tudo isso [rumor de renúncia" é uma manobra política do [presidente Eduardo] Duhalde", afirmava Maria que, na madrugada de ontem, não ousava pensar na possibilidade de renúncia.
Seu pedido, igual ao da centena de menemistas que cantava "que volte Menem" na rua Cerrito -onde fica o hotel em que se hospedou durante toda a campanha-, não foi atendido. Às 16h30 da quarta-feira, os rumores foram confirmados e o ex-presidente retirou sua candidatura presidencial.

Medo
Maria tem seis filhos e está desempregada há quatro anos. Seu marido perdeu o emprego há dois anos e hoje vive de bicos "aqui e ali". "A minha sorte é que um dos meus filhos trabalha num laboratório. Mas tenho medo. Do jeito que as coisas vão, o meu filho também pode perder o emprego. Só Menem pode evitar que isso aconteça", disse.
Maria Amati, como a maioria dos 4,7 milhões de eleitores de Menem, não entende a atual crise econômica vivida no país como consequência da política macroeconômica praticada pelo ex-presidente nos dez anos em que esteve à frente da Casa Rosada (sede do governo), entre 1989 e 1999.
Para essas pessoas, Menem é o único representante genuíno do difuso peronismo, coração do PJ (Partido Justicialista) e do qual Néstor Kirchner também faz parte.
"Menem é hoje a única alternativa do peronismo. Com sua renúncia, a esperança de melhora some", afirmou outro simpatizante, Oscar Pettinato. "O peronismo não é um partido. É um estilo de vida, e os peronistas que estão aí no poder não representam nada do que o peronismo prega."

Desânimo
O clima de euforia que contagiou os corredores do hotel Presidente na madrugada, no entanto, não se estendeu às ruas durante o dia de ontem. Às 13h40, quando ainda se aguardava a resposta do ex-presidente sobre sua candidatura, a sede do partido de La Matanza, grupo político estreitamente ligado ao menemismo e que organizou parte da mobilização de ontem, estava vazia.
Os poucos cartazes, dizendo "estamos com Menem para que a Argentina cresça", estavam jogados pelo chão e sinalizavam o desânimo de quem, poucas horas antes, alimentava a esperança de ir às urnas no próximo domingo.
"Menem perdeu porque não mentiu. Devia ter feito o que sempre fez: mentir. Mas, com 72 anos, a gente já está cansado e não tem tanta disposição para lutar", afirmou Pettinato.


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