São Paulo, domingo, 16 de junho de 2002

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Para analista, eleitor de esquerda está órfão

DE PARIS

A esquerda declina na França porque não é mais uma verdadeira esquerda. A crise se deve ao fato de, nas últimas décadas, os esquerdistas terem se aproximado cada vez mais dos princípios da direita. Assim a escritora e ensaísta Viviane Forrester explica a situação do Partido Socialista na França, que nos últimos 20 anos governou o país e agora sai carregado de derrotas nas eleições.
Forrester, 74, é autora de "O Horror Econômico" (Unesp), veemente crítica ao neoliberalismo que foi best-seller na França. Em 2001, ela publicou "A Ditadura do Lucro". Atualmente, escreve um ensaio sobre o Oriente Médio, a ser publicado em 2003. (ALN)

Folha - Quais são as lições deixadas pelas eleições francesas?
Viviane Forrester -
Achamos que o país tinha evoluído para o fascismo, após o primeiro turno das presidenciais. Mas o segundo turno provou que a França era majoritariamente antifascista. O que as eleições demonstraram é que falta uma esquerda na França.

Folha - E a esquerda que há hoje?
Forrester -
Não é uma verdadeira esquerda. Considera arcaico o que está à esquerda e faz a apologia do liberalismo. Mas, na França e no resto do mundo, há uma opinião pública muito politizada que não encontra eco no meio político. Há uma população que considera o liberalismo um sistema econômico nocivo. Nenhum partido de esquerda responde a essa reflexão. É absurdo dizer que [o ex-premiê Lionel" Jospin perdeu as eleições por ter feito uma má campanha. Ele perdeu porque as pessoas já não se interessam por uma chamada esquerda que não está de fato à esquerda. A opinião pública não é idiota.

Folha - A crise da esquerda é uma particularidade francesa?
Forrester -
Não. No sentido de a esquerda ter se inclinado à direita, eu diria que a França está atrasada. [O premiê" Blair, no Reino Unido, ou [o premiê" Schröder, na Alemanha, estão muito menos à esquerda que Jospin.

Folha - O que a esquerda pode aprender com a vitória da direita?
Forrester -
Chirac venceu, mas teve menos de 20% no primeiro turno. A maioria das pessoas não é tão ultraliberal. Espero que a esquerda possa se recompor, com outro sentido da política. Sou de esquerda e acho que ela deveria reunir dirigentes que sejam de fato dessa tendência. É preciso ouvir as pessoas, interessar-se por elas e parar de dizer que a modernidade é coisa da direita -se é de direita, porque as pessoas vão votar na esquerda? No momento, aliás, a modernidade é absolutamente regressiva, pois voltamos à moral e à filosofia política do século 19.

Folha - A alta taxa de abstenção é sinal de apatia política?
Forrester -
Não. As pessoas têm uma cultura política inacreditável. Os eleitores se abstêm porque não encontram um partido que reflita verdadeiramente com eles.



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