São Paulo, sábado, 17 de maio de 1997.



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HISTÓRIA
Zaire foi o centro do confronto entre Estados Unidos e União Soviética na África, durante a Guerra Fria
Riqueza dificultou o fim da colonização

da Reportagem Local


A descolonização da África negra teve no Zaire (ex-Congo Belga) seu mais violento e demorado capítulo. Duas razões para isso.
Havia o que os técnicos europeus designavam, com ironia, como um "escândalo geológico": alta concentração de minérios no país.
Em segundo lugar, o Zaire -maior que o México, duas vezes o tamanho da Bolívia- tornou-se a partir de 1960 o epicentro do confronto entre as duas superpotências, Estados Unidos e União Soviética. Foi um dos pontos quentes durante a Guerra Fria.
Em 1959, manifestações pela independência provocavam 42 mortos em Leopoldville (atual Kinshasa). Bruxelas recua e aceita a criação de um Estado. O Zaire nasce em 39 de junho de 1960. Joseph Kazavubu é eleito presidente. Patrice Lumumba é escolhido premiê.
Ambos se definem como socialistas e não-alinhados, o que, para a Bélgica e os Estados Unidos, era meio caminho andado para a repetição, na África, do mau exemplo que Cuba daria no Caribe.
As Províncias ricas em minerais do sul, região de Katanga, proclamam a independência, com a ajuda de Bruxelas e da CIA, a central de inteligência norte-americana.
Lumumba apela para a ONU, que envia 19 mil homens. Lança outro apelo em direção à URSS, o que lhe custa o cargo. Ele seria assassinado em janeiro de 1961.
Em outubro daquele ano, o secretário-geral da ONU, o sueco Dag Hammarskjöld, morre em acidente aeronáutico, sobre o qual pesam até hoje suspeitas.
A Província separatista de Katanga volta ao Zaire em 1963. Outro separatista, Albert Kalongdji, autoproclamado "imperador" dos Balubas, é enquadrado.
As coisas só se normalizam quando um oficial de 34 anos, chamado Mobutu Sese Seko, dá um golpe com o apoio dos Estados Unidos e inicia, em novembro de 1965, sua longa ditadura.
Não há estimativas confiáveis sobre o número de mortes, no Zaire, durante o período de agitação pós-independência. Poderão ter sido 300 mil ou mais que isso.
Muito sangue também correu na África do Norte. A Guerra da Argélia matou de 300 mil a 600 mil pessoas (não há tampouco, no caso, estimativa mais precisa), antes que aquela "província" da França se tornasse independente, em 1962.
Na África negra, que assistiria ainda a uma guerra civil em Angola, a França sufocou revoltas na Costa do Marfim (1950) e nos Camarões (1955).
Não houve no continente africano um modelo único de descolonização. A própria colonização, a partir do século 16, obedecera a receitas diferenciadas.
Começava, como no caso de Portugal em Angola, com entrepostos litorâneos para a compra de escravos ou matérias-primas, e terminava em protetorado ou em pura anexação territorial.
O que prevaleceu entre as potências coloniais -Reino Unido, Bélgica, Espanha, França, Itália e, mais tardiamente, Portugal- foi a descoberta de que o capitalismo chegara a um ponto em que dispensava a manutenção institucionalizada de impérios coloniais.
Nos anos 50, a tecnologia agregada aos produtos das metrópoles passou a ter um peso gradativamente maior. As "commodities" poderiam ser obtidas por mecanismos de dominação mais sutis e menos agressivos.
Muitos dos processos de independência foram pacíficos, como o do Marrocos (1956), ex-protetorado francês, ou o do Quênia (1963), ex-colônia britânica.
(JOÃO BATISTA NATALI)




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