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Clinton usa guerra para sobreviver
CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
da Sucursal de Brasília
Bill Clinton tem usado com frequência artifícios de guerra e paz
no seu sisífico esforço de se desvencilhar dos constrangimentos
do escândalo Monica Lewinsky.
Em diversos momentos críticos
do caso que inferniza seu governo,
o presidente dos EUA tentou interpretar o papel de Ares, o deus grego que representava a guerra, na
esperança de que o público deixasse de associá-lo com Eros.
Pelo menos no curto prazo, tem
conseguido sucesso. Os norte-americanos têm uma tradição cultural fortíssima: esquecem suas
dissensões internas sempre que
acham que o país está sob a ameaça
de qualquer inimigo externo.
A regra não falha. Funcionou,
por exemplo, em 20 de agosto,
quando, logo depois de ter admitido pela primeira vez em público
sua relação "não apropriada" com
Lewinsky, Clinton ordenou ataque
contra Sudão e Afeganistão.
O "timing" era tão suspeito que
dois senadores chegaram a questionar as razões do presidente.
Mas suas vozes foram logo caladas pela avalanche de apoio de políticos, da oposição e do governo, e
de cidadãos comuns à decisão.
O líder da oposição, Trent Lott,
resumiu o sentimento nacional:
"Todos devemos dar apoio ao presidente neste momento", disse ele.
Pouco importa que nos meses seguintes se tenha provado que a
agressão contra os dois países (feita em nome do combate ao terrorismo) foi inócua.
Também não causou comoção o
fato de, até agora, quatro meses depois, os EUA não terem oferecido
ao mundo provas de que o seu alvo
principal no Sudão não era, como
afirmam os sudaneses, uma inofensiva fábrica de medicamentos, e
sim de armas químicas.
Bastou Clinton considerar a possibilidade de uma ação militar
contra o Iraque, o ainda inimigo
nacional número um dos EUA, para a ladainha da unidade nacional
ser invocada uma vez mais.
Newt Gingrich e Bob Livingston,
o presidente da Câmara que sai e o
que entra, já anunciaram sua disposição de suspender o debate e a
votação do impeachment de Clinton para deixá-lo exercer em paz as
funções de líder militar do país.
Nada melhor para Clinton: ganhará preciosos dias para pressionar os 74 deputados indecisos na
questão do impeachment, envolto
na aura de popularidade que essas
ações bélicas costumam gerar.
Nas vezes em que tentou representar a figura de pomba da paz
para esconjurar o escândalo, Clinton não obteve tanto êxito quanto
na sua representação marcial.
Em 21 de janeiro, o presidente
sofreu o vexame de ser impiedosamente assediado por jornalistas
que só queriam saber de Lewinsky
no Salão Oval da Casa Branca, ao
lado de um embaraçado Arafat.
Em 21 de setembro, no dia em
que o país viu o vídeo de seu depoimento ao júri de inquérito do escândalo, Clinton tentava, de novo,
se converter no responsável pelo
acordo final da paz no Oriente Médio. Mas Netanyahu não o ajudou
e frustou sua ambição.
De regresso a Washington após
outro malogrado esforço de conciliar Arafat e Netanyahu, Clinton
resolveu apelar para o recurso
mais seguro de punir o sempre disponível vilão Saddam Hussein.
O público norte-americano continua disposto a sacrificar tudo em
nome da necessidade de apoiar seu
líder em tempos de confronto.
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