São Paulo, quarta-feira, 18 de setembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

IRAQUE

Comissão de desarmamento da ONU já prepara volta a Bagdá; chefe dos inspetores prevê um ano para encerrar trabalho

Analistas prevêem fracasso das inspeções

MARCELO STAROBINAS
DA REDAÇÃO

O chefe dos inspetores de armas da ONU, Hans Blix, se reuniu ontem com altos funcionários iraquianos para discutir a retomada das inspeções dos arsenais de destruição de massa do ditador Saddam Hussein. Eles marcaram novo encontro para finalizar os planos dentro de dez dias, em Viena.
A Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), responsável pela verificação do programa nuclear iraquiano, disse ter 15 pessoas prontas para ir a Bagdá assim que forem autorizadas.
Apesar da prontidão e otimismo que tomou conta dos órgãos responsáveis pelo desarmamento do Iraque, especialistas consultados pela Folha observam com enorme ceticismo as chances de sucesso da missão da Comissão de Monitoramento, Verificação e Inspeção da ONU (Unmovic), dirigida pelo sueco Blix.
Segundo ele, a comissão -criada em 1999 para substituir a Unscom (Comissão Especial da ONU para o Desarmamento)- precisaria de cerca de um mês entre a autorização de entrada de Bagdá (concedida anteontem) e o início dos trabalhos no país.
Depois disso, os inspetores levariam cerca de um ano -isso se Saddam cooperar "totalmente"- para tirar suas conclusões e preparar um relatório sobre quais armas continuam à disposição do líder iraquiano.
Há poucos motivos para acreditar, na visão dos especialistas, que esse órgão tenha a capacidade de eliminar os arsenais de Saddam.
"Da forma como estão constituídas, as inspeções da ONU nunca funcionarão", argumentam, em artigo no "New York Times", Gary Milhollin, diretor do Projeto Wisconsin para o Controle de Armas Nucleares, e Kelly Motz, editora do IraqWatch.org.

Inexperiência
Se nem a Unscom -que, entre 1991 e 1998, destruiu mísseis e várias toneladas de armas químicas e biológicas no Iraque- foi capaz de erradicar os armamentos não-convencionais, diz Motz, o que será da Unmovic, que nunca antes pôs os pés em solo iraquiano?
Criada após o fracasso da Unscom -o Iraque fechou as portas aos inspetores daquela agência, acusando-a de servir como braço de espionagem dos EUA- a Unmovic possui 63 inspetores e 220 especialistas em diversas áreas preparados para atuar em campo.
O número é pequeno diante da complexidade da tarefa. As forças de segurança do Iraque monitoram os movimentos dos inspetores para prevenir flagrantes. As armas de Saddam são facilmente transportadas -o país criou técnicas para, em poucas horas, transferir laboratórios inteiros, mísseis e seus componentes de um esconderijo a outro.
Além disso, observa Motz, como Washington estará aguardando qualquer empecilho imposto pelo governo do Iraque às inspeções como justificativa para uma guerra, a Unmovic possivelmente tentaria evitar confrontos -o que prejudicaria os resultados da missão de desarmamento.
"Há uma possibilidade de que os inspetores não queiram fazer um relatório com fortes acusações ou tomar posição agressiva nas inspeções", afirma Motz. "Isso porque, após dois ou três anos em Nova York se preparando para entrar no Iraque, eles não vão querer voltar imediatamente para casa para que os EUA possam bombardear o Iraque."
Já Daryl Kimball, diretor da Arms Control Association, organização de pesquisa sobre proliferação de armas com sede em Washington, acha que a inexperiência da Unmovic ou a sua falta de recursos não prenunciam o fracasso das inspeções. A seu ver, porém, o maior obstáculo será Saddam, que tentará novamente impedir o acesso dos inspetores aos armamentos e aos seus chamados "palácios presidenciais".
Em 1998, o Iraque conseguiu um acordo com a ONU segundo o qual grandes propriedades do governo só podem ser inspecionadas após a agência da ONU avisar com antecedência a sua visita e a composição de sua equipe.
Diante do histórico iraquiano, Kimball defende a adoção de uma nova resolução no Conselho de Segurança, "reiterando o que o Iraque deve fazer e autorizando o uso da força militar se Saddam Hussein não cooperar". Só assim, diz ele, com Bagdá pressionada pela ameaça de guerra, as inspeções poderiam ter êxito.


Com agências internacionais

Texto Anterior: Diplomacia: Iraque divide Conselho de Segurança da ONU
Próximo Texto: "Saddam vai dificultar", prevê ex-mediador brasileiro na ONU
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.