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COMENTÁRIO
Na prática, Bush exerce poderes ditatoriais
WILLIAM SAFIRE
DO "THE NEW YORK TIMES"
Mal aconselhado por um secretário da Justiça frustrado e tomado por pânico, um presidente dos
Estados Unidos acaba de adquirir
o que na prática são poderes ditatoriais, que permitem prender ou
executar estrangeiros.
Intimidados por terroristas e inflamados por uma paixão por justiça rudimentar, estão deixando
George W. Bush substituir o Estado de Direito americano por cortes marciais fantoches.
Em sua infame ordem executiva
de emergência da semana passada, Bush admite dispensar "os
princípios da lei e as regras de evidência" que sustentam a Justiça
dos EUA. Ele assume o poder de
restringir as cortes e montar seus
próprios "tribunais marciais"
-grupos de oficiais que vão julgar não-cidadãos que o presidente precisa apenas dizer "ter razão
para acreditar" que são membros
de organizações terroristas.
Não satisfeito com sua decisão
anterior de permitir que a polícia
coloque uma escuta nas conversas entre um suspeito e seu advogado, Bush agora arranca do estrangeiro até os direitos limitados
oferecidos pela corte marcial.
Suas cortes fantoches podem
ocultar evidências em nome da
segurança nacional, criar suas
próprias regras, considerar um
acusado culpado mesmo que um
terço dos oficiais não concordem
e executar o estrangeiro sem direito a revisão do processo por
qualquer tribunal civil.
O braço judiciário e um júri independente não ficam mais entre
o governo e o acusado. No lugar
desses freios e contrapesos, centrais nesse sistema legal, não-cidadãos enfrentam um Poder Executivo que se tornou investigador,
advogado de acusação, juiz, júri,
carcereiro e carrasco. Em um toque orwelliano [referência ao escritor George Orwell, autor de
1984", a ordem executiva de Bush
chama essa abominação em estilo
soviético de "um julgamento
completo e justo".
Em que base legal se sustenta esse César? Um precedente que a
Casa Branca cita é a corte militar
depois do assassinato de Lincoln.
(Durante a Guerra Civil americana, Lincoln suspendeu o direito a
habeas corpus; agora, a guerra
contra o terror vai exigir aprisionamento ilegal?) Outro é o enforcamento, sentenciado por uma
corte militar e aprovado pela Suprema Corte, de sabotadores alemães que chegaram aos EUA de
submarino durante a Segunda
Guerra Mundial.
Defensores das cortes fantoches
de Bush dizem: "Você, tolerante
com o terror, defensor dos procedimentos legais, sabe que há uma
guerra ocorrendo? Você esqueceu
as 5.000 pessoas mortas. Em uma
emergência como essa, não são
necessárias medidas de segurança
extremas para salvar a vida de cidadãos? Se pisarmos nos pés de
algumas pessoas, podemos pedir
desculpas aos defensores dos direitos civis depois".
Esses são os argumentos dos falsos durões. Em um momento no
qual até os liberais estão debatendo a ética da tortura de suspeitos
-pesando o desgosto por barbarismo contra a necessidade de salvar vidas inocentes- é hora de
iconoclastas conservadores e linha-duras de carteirinha defenderem os valores americanos.
Para lidar com uma emergência, é claro que algumas regras
têm de ser afrouxadas. Uma rede
de informações étnicas, juntando
pessoas sem visto, ou o interrogatório de estudantes estrangeiros,
no curto prazo, está no limite do
tolerável.
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