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Presidente dividiu o país para manter o poder
IAN FISHER
DO "THE NEW YORK TIMES", NO QUÊNIA
Laurent Kabila preferiria dividir
o país a dividir o poder. Talvez haja Congo demais para ser repartido, e talvez seja essa uma das razões dos conflitos intermináveis
que dilaceram o país.
Em menos de três anos sob o
governo de Kabila, um país do tamanho da Europa ocidental
transformou-se no campo de batalha de um conflito que vem sendo descrito como a "Primeira
Guerra Mundial africana".
Desde 98, soldados de até nove
países africanos já lutaram no
Congo em um momento ou outro. Nesse processo, o coração da
África tornou-se ainda mais caótico do que sob três décadas de
governo falho do antecessor de
Kabila, Mobutu Sese Seko.
Até 2 milhões de pessoas já foram deslocadas pela guerra, muitas delas quando os combates se
intensificaram, nos últimos meses. Os massacres são frequentes,
e a desnutrição é crônica. Os conflitos étnicos se multiplicam.
E a guerra dividiu o Congo pelo
meio, com Kabila e seus aliados
controlando o oeste e sul e os rebeldes e seus aliados dominando
o norte e leste do país.
"A integridade territorial do
Congo está ameaçada, e a mesma
coisa acontecerá com a estabilidade de seus nove vizinhos, se o caos
se mantiver como está", diz relatório do Grupo Internacional de
Crises, organização de pesquisa e
defesa de causas.
O governo de Mobutu acabou
realçando até que ponto muitos
da primeira geração de líderes
africanos não conseguiram fugir
do oportunismo dos colonialistas.
O comércio de diamantes, cobre
e urânio fez dele um dos homens
mais ricos do mundo. Mas seus
excessos foram apenas uma parte
da razão pela qual Kabila, um ex-combatente guerrilheiro e proprietário de boate, chegou ao poder em maio de 1997, poucos meses antes de Mobutu morrer no
exílio, no Marrocos. A ascensão
de Kabila se deveu à complicada
política da região e, em especial,
aos problemas do pequeno vizinho do ex-Zaire a leste, Ruanda.
Em 1994, hutus militantes massacraram pelo menos 500 mil tutsis em Ruanda e, depois disso,
cerca de 1 milhão de hutus fugiram para o leste do Congo (que,
na época, era conhecido como
Zaire), enquanto rebeldes tutsis
assumiam o controle de Ruanda.
Mas as milícias hutus continuaram seus ataques a Ruanda, desde
suas bases no Zaire. Em busca de
segurança em sua fronteira e de
uma liderança zairense mais flexível e aberta a seus interesses,
Ruanda apoiou, em segredo, uma
revolta de oficiais tutsis insatisfeitos no Exército de Mobutu, com a
ajuda de Uganda e Angola.
Kabila foi nomeado líder da rebelião, que capturou Kinshasa.
Ele mudou o nome do país de Zaire para República Democrática
do Congo, outra vez, e prometeu
democracia. Mas parece ter percebido que não conseguiria governar o país agindo apenas como
instrumento de Ruanda e Uganda, e, assim, seus aliados foram
transformados em inimigos.
Kabila foi salvo da reação por
soldados de Angola, Zimbábue e
Namíbia. Cada país tinha suas razões próprias para ajudar Kabila,
entre elas o desejo de abocanhar
parte dos diamantes, do petróleo
ou das férteis terras do Congo.
À medida que a guerra foi avançando -e, na maior parte, se atolando em impasses-, as complexidades dela foram se multiplicando geometricamente.
O grupo rebelde original
-Reunião Congolesa pela Democracia- se dividiu em dois,
com Ruanda apoiando um lado e
Uganda, o outro. A seguir, Ruanda e Uganda passaram a enfrentar-se no território do Congo.
Um terceiro grupo rebelde,
apoiado por Uganda, surgiu na cidade que era de Mobutu, Gbadolite. E, ao mesmo tempo em que
tudo isso fervilha, uma guerra étnica vem sendo travada no leste
do Congo.
Tradução de Clara Allain
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