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O NOVO PAPA
DOUTRINA
Onda conservadora ocidental é reforçada
Bush na Casa Branca e Ratzinger no Vaticano sugerem uma opção clara pelo combate aos ideais liberalizantes dos anos 90
DO ENVIADO ESPECIAL A ROMA
Primeiro Bush 2º, agora Bento
16. A onda conservadora que assola o mundo desde o começo
deste século agora chega a mais
um momento apoteótico, a eleição de Joseph Ratzinger ao cargo
de chefe supremo da maior igreja
cristã do mundo, com cerca de 1
bilhão de fiéis. Há algum paralelo
possível sobre o que aconteceu
nos EUA em novembro do ano
passado, quando mais de 50 milhões de pessoas elegeram George
W. Bush para um segundo mandato, com a eleição por números
secretos do alemão ontem?
Não e sim. O não fica por conta
da diferença básica: um elegeu-se
num sufrágio popular, outro num
conclave secreto. Democracia e
religião são quase imiscíveis, e
desde pelo menos o século 18 isso
virou boa norma de governo.
Dito isso, é significativa a eleição
de Ratzinger, um cruzado da idéia
de uma Igreja Católica fundamentalista, antiglobalização, antimodernidade, justamente num
momento em que o também integrista, isolacionista e tradicionalista Bush governa a maior potência militar do mundo, que move
sua própria cruzada, a "guerra ao
terror". Como chefe da maior potência religiosa e, para muitos,
moral do mundo, Bento 16 irá
operar numa banda semelhante à
do presidente dos EUA, descontadas as óbvias diferenças.
O que isso diz do mundo em
que vivemos? Primeiro, que a crise existencial do homem moderno, um homem sem deuses ou
pátrias, está gerando um refluxo.
Depois da farra liberal dos anos
90, quando o fim da Guerra Fria
parecia anunciar um mundo multipolar e integrado, com a bonança dos anos Clinton gerando uma
prosperidade artificial no mundo
rico que só foi acabar quando estourou a bolha da internet, em
2000, e um abismo de miséria no
mundo pobre, veio a dúvida.
Para onde estamos indo? A farra
acentuou a emergência de "Sudões", ajudou a fomentar a Al
Qaeda e o 11 de Setembro, e da
moral clintoniana os americanos
lembram mais de Monica Lewinsky. Com isso, abriu-se o caminho para a ansiedade do Ocidente buscar algum tipo de agenda mais sólida. Nos EUA, o que
havia à mão era o amálgama de
denominações protestantes que
pregam um fundamentalismo
quase apocalíptico, mas que diz
muito ao paroquiano da América
rural. À Europa ainda tentando
achar um caminho por meio de
uma economia forte calcada no
euro, mas patética frente ao poderio americano, restou dizer
amém. Expoentes dos róseos
anos 90, como Tony Blair, dizem
sim aos antes espezinhados texanos que ocupam a Casa Branca.
No mundo católico, João Paulo
2º já vinha trilhando esse caminho. Mas ele era uma incógnita
teológica. Acabou como um dos
grandes nomes do catolicismo,
mas seus feitos se concentram nos
seus primeiros anos de papado.
Era uma relíquia do século 20.
Já Ratzinger, como seu inquisidor-mor, representa uma opção
clara. Para encarar o mundo moderno, apenas uma Igreja Católica firme em princípios que datam
de séculos poderá sobreviver. E,
talvez, até conquistar fiéis mais
convictos, como um banco antigo, que atrai clientela porque não
quebra. Pelo menos foi isso que
os cardeais proclamaram ontem.
Como consolo para os liberais,
o movimento parece ser pendular, embora seja arriscado cair na
falácia da repetição da história. O
que é inescapável é que a eleição
de Bento 16 é um sinal eloqüente
do lado da balança em que o
mundo, pelo menos o ocidental,
está.
(IGOR GIELOW)
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