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DIA DE TERROR
Entidade internacional foi a responsável pela aprovação e implantação do embargo econômico imposto ao Iraque por 13 anos
População iraquiana odeia Nações Unidas
SÉRGIO DÁVILA
DA REPORTAGEM LOCAL
Quando a reportagem da Folha
voltou a Bagdá em 10 de abril, dois
dias depois da queda do regime
de Saddam Hussein e depois de
passar duas semanas na capital
iraquiana ainda sob bombardeio,
chamava atenção a quantidade de
carros incendiados pela parcela
da população que, revoltada, foi
às ruas para saquear. Entre os veículos destruídos, várias eram as
novíssimas caminhonetes azuis e
brancas da Organização das Nações Unidas (ONU).
Até então, estes jipes esperavam
na chamada Terra de Ninguém, a
faixa de terra na fronteira iraquiana-jordaniana. Tinham sido removidos para lá no ultimato de
George W. Bush, quando o secretário-geral da organização, Kofi
Annan, mandou retirar todos os
seus funcionários do Iraque. Os
funcionários esperavam ali o fim
da ditadura, pois julgavam que
então poderiam entrar a salvo no
país e ajudar a reconstruí-lo.
Foi o que fizeram já no dia 9 de
abril, para encontrar, em vez das
flores e abraços, a revolta da população. Funcionários bem-intencionados tiveram de correr de
seus carros, que foram então saqueados e incendiados. Este episódio ilustra perfeitamente o erro
principal da organização no Iraque: seus burocratas ainda não
perceberam que o iraquiano médio odeia a ONU com a mesma
intensidade com que odeia os invasores norte-americanos.
Afinal, seu país sofreu 13 anos
de embargo econômico aprovado
e implantado pela entidade, decisão que depauperou o Iraque e
afetava a população em questões
que iam da infra-estrutura (faltavam canos para esgoto, por exemplo) ao dia-a-dia (as crianças não
tinham papel para escrever na escola; usavam embrulhos, jornais
velhos etc.). Além disso, foi a mesma ONU que nos meses pré-guerra patrocinou o desmonte militar
do país, que depois seria invadido
mesmo assim.
Não importa à população que o
causador do embargo tenha sido
o próprio Saddam Hussein, ao invadir o Kuwait em 1990. Sob censura severa, o iraquiano passou os
últimos dez anos sendo "informado" exclusivamente pelo governo
e acreditando que a entidade sediada em Nova York era apenas
mais um braço a serviço do imperialismo ianque.
A ignorância da ONU quanto a
este sentimento do iraquiano se
revela no descuido com que vinha
tratando de sua segurança em
Bagdá. O local escolhido para ser
quartel-general, o hotel Al-Qanal,
é exemplo disso. A cerca de oito
quadras a noroeste do hotel Palestine, fica no meio de um bairro
pobre, na margem "errada" do rio
Tigre, longe da chamada cidade
nova e portanto distante da segurança do comando militar norte-americano.
A guerrilha que toma o país hoje
tem sua origem nos saques que
explodiram por todo o Iraque assim que a panela de pressão em
que viviam os iraquianos nas últimas três décadas foi destampada.
Assim, os ataques contam com
uma lógica, perversa, mas lógica:
logo após a queda de Saddam, os
primeiros alvos foram os edifícios
e as pessoas ligadas ao antigo regime; depois, evoluíram para os invasores que teimam em não deixar o país -nos 43 dias oficiais da
guerra, morreram menos de 50
soldados norte-americanos, este
número dobrou no pós-guerra.
Agora, parecem acertar contas
com os supostos colaboradores
das forças invasoras. Primeiro, foi
a embaixada da Jordânia, país
acusado de fechar os olhos para a
presença militar norte-americana
durante a guerra. Depois, a ONU,
pelos motivos já citados.
E o que os motiva é o paradoxo
que define a atual situação no Iraque: a população odiava a ditadura sangrenta de Saddam, é agradecido à coalizão anglo-americana por derrubá-la, mas quer que
os invasores deixem o país o
quanto antes -ontem, de preferência. Como os EUA não dão sinal de que largarão o osso tão cedo, a guerra está só começando.
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