São Paulo, domingo, 20 de agosto de 2006

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Kirchner e Lavagna racham a histórica UCR argentina

Presidente ganha aliados na antiga oposição; ex-ministro é o preferido de Alfonsín

Partido mais antigo do país, UCR perdeu força com fracasso de ex-presidente De la Rúa; líderes se dividem entre governo e oposição

BRUNO LIMA
DE BUENOS AIRES

A tradicional UCR (União Cívica Radical), partido político argentino criado em 1891 e que, a partir de 1945, consagrou-se como adversária histórica do peronismo, está à beira de um racha que, nesta semana, tomará corpo com a ausência anunciada de pelo menos quatro dos seis governadores filiados à legenda na convenção nacional, na sexta-feira.
A pouco mais de um ano das eleições presidenciais, que devem ocorrer em outubro de 2007, o presidente da Argentina, o peronista Néstor Kirchner, usa de todas as armas para atrair o apoio dos governadores e prefeitos radicais e, assim, liquidar o único de seus adversários com chances reais de crescer nas pesquisas e dificultar sua reeleição: seu ex-ministro da economia, Roberto Lavagna.
Embora também se apresente como peronista, Lavagna teve seu nome anunciado pelo ex-presidente Raúl Alfonsín -o principal cacique político da hoje enfraquecida UCR-, como o candidato que terá o apoio dos radicais.
Antes de ser ministro de Kirchner e de Eduardo Duhalde (que presidiu o país de janeiro de 2002 a maio de 2003), Lavagna foi secretário de comércio no governo Alfonsín (1983-1989). Ele ainda não admite ser candidato, mas aumentou sua participação em programas de TV nos últimos quinze dias.
É o único que, ao cobrar para si o mérito da recuperação econômica argentina, poderia fazer frente ao kirchnerismo.
O último presidente eleito pela UCR foi Fernando de la Rúa, que abandonou o cargo na metade do mandato em meio a maior recessão da história do país. Depois da desvalorização do peso e da moratória da dívida externa, o país voltou a crescer com Kirchner e Lavagna.
À Folha, Ricardo Alfonsín, 54, dirigente da UCR e filho do ex-presidente, explicou que Lavagna seria uma alternativa ao estilo de "Fernando Henrique [Cardoso] para o Brasil e Ricardo Lagos para o Chile", com bom trânsito entre empresários e academia.
Segundo ele, a convenção deve definir um programa político para 2007 e decidir que, com Kirchner, a UCR não está.
"Kirchner não falou com a direção da UCR. Está empreendendo uma operação para desmembrar o partido, com pressão sobre os governadores, já que controla os recursos das Províncias", disse.
Para o sociólogo Torcuato Di Tella, ex-ministro da Cultura de Kirchner, a fratura da UCR é "típica dos partidos de centro": "O mesmo ocorreu com o partido radical do Chile, que praticamente desapareceu."
"A UCR vai diminuir e seguramente se dividir. Para sobreviver, terá que se aliar ao setor da esquerda real do país, que é o peronismo kichneriano. Cada país tem a esquerda que pode, não a que quer. Isso é a Argentina, e aqui o partido peronista é o mais próximo que temos do partido Democrata dos EUA. Não é um partido socialista nem social-democrata, mas se parece", complementou.

Radicais K
Chamados de "Radicais K", os apoiadores de Kirchner filiados à UCR fizeram há uma semana um ato público de apoio ao governo. Estiveram presentes, além dos governadores, 183 dos 611 prefeitos radicais.
"A reunião dos radicais pró-Kirchner evidencia que a estratégia oficialista é juntar-se aos chefes territoriais. A crise que explodiu em 2001 mostrou a fraqueza dos partidos políticos e fortaleceu os governadores. É por isso que Kirchner centra sua estratégia nos governadores e prefeitos, seja qual for a procedência", diz o analista político Rosendo Fraga.

Avaliação positiva
Nas pesquisas de opinião, cerca de 20% dos eleitores desaprovam Kirchner. A porcentagem chega a 40% nas classes alta e média. Nos estratos mais pobres, é de 15%. O restante da população avalia positivamente o presidente -mas vale dizer que, na maioria dos estudos não é dada ao entrevistado, como no Brasil, a opção de avaliação "regular", somente "positiva" e "negativa".
Além de Lavagna, outros dois nomes se apresentam à corrida eleitoral como opositores de Kirchner: Elisa Carrió, ex-UCR, que chama o atual presidente de fascista e que, ao mesmo tempo, elogia o ex-presidente FHC e a candidata do PSOL, Heloísa Helena; e o presidente do clube de futebol Boca Juniors, Mauricio Macri, que pode acabar se associando a Lavagna.


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