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São Paulo, sexta-feira, 21 de março de 2003

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Ação militar será mais agressiva que em 91, diz general

MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO

A atual missão americana parece ser mudar o regime iraquiano após a deposição do ditador Saddam Hussein. Ela demandará uma campanha militar mais agressiva que a realizada na Guerra do Golfo (1991). Forças terrestres serão usadas rapidamente e haverá pesados ataques aéreos.
A análise é de William L. Nash, general da reserva do Exército dos EUA e diretor do Centro para Ação Preventiva do Council on Foreign Relations (Washington). Na ativa, ele comandou uma brigada blindada americana durante a operação Tempestade no Deserto, na Guerra do Golfo.
De acordo com ele, durante essa operação, houve por volta de 40 dias de bombardeios antes do ataque por terra. Desta vez, as forças terrestres serão necessárias bem mais cedo por conta do tipo de missão que os americanos querem realizar no Iraque.
Leia a seguir a entrevista de Nash, por telefone, à Folha.
 

Folha - A ofensiva contra o Iraque foi lançada. Quais são as reais razões da determinação americana?
William L. Nash -
Cheguei à conclusão, após observar alguns documentos do Departamento da Defesa, de que é importante levar em conta a preocupação sincera do presidente [George W.] Bush com a possibilidade de Saddam passar armas de destruição em massa a grupos terroristas. Com o tempo, ele poderá fornecer essas armas a grupos que não hesitariam em usá-las contra os EUA.
Não creio que seja verdadeiro o argumento de que o petróleo iraquiano é a principal motivação americana. Baseado nos documentos sobre o arsenal iraquiano a que tive acesso, devo dizer que não acredito nisso.

Folha - Do ponto de vista militar, a guerra é necessária?
Nash -
A ameaça [iraquiana] de utilizar armas de destruição em massa é muito grave e constituiu uma séria ameaça aos EUA. Assim, não é, de forma nenhuma, inadequado que o presidente [Bush] esteja bastante preocupado com o assunto.
Não tenho certeza de que, na prática, essa ameaça seja tão importante quanto parece. Isso sobretudo no que se refere ao aspecto espaciotemporal. Ou seja, não sei se devemos tomar uma posição radical agora porque a ameaça talvez ainda não seja tão séria.
Na verdade, a questão da estratégia militar não é tão relevante quanto a avaliação da ameaça representada pelo Iraque. Por outro lado, como parte da comunidade internacional começa a mostrar-se disposta a exigir militarmente o desarmamento do Iraque, podemos imaginar que os dirigentes de um bom número de países estejam convencidos de que Saddam é realmente perigoso.

Folha - A nova guerra será similar à Guerra do Golfo?
Nash -
Haverá similaridades, porém é muito importante ter em mente que as duas missões são diferentes. Em 1991, a missão era forçar a saída das tropas de Saddam do Kuait. Assim que a decisão de usar força militar foi tomada, aquela missão foi cumprida rapidamente e com sucesso.
A missão agora parece ser mudar o regime iraquiano após a deposição de Saddam. Ela demandará uma campanha militar mais agressiva. Certamente, veremos o uso de forças terrestres rapidamente, além de pesados ataques aéreos. Durante a operação Tempestade no Deserto, houve por volta de 40 dias de bombardeios antes do ataque por terra. Desta vez, as forças terrestres serão necessárias bem mais cedo por conta do tipo de missão.

Folha - Especula-se que o Iraque seja bem mais fraco hoje que em 1991. Os EUA poderão ter dificuldade para cumprir sua missão?
Nash -
No geral, sem dúvida, as forças iraquianas são mais frágeis agora que na década passada. No entanto, por causa da diferença essencial entre as duas missões, haverá partes da campanha militar que serão mais difíceis agora que no passado. Digo isso porque a decisão de depor um regime significa que o inimigo fica com sua própria sobrevivência ameaçada, podendo fazer o que quer que seja para manter-se vivo.
Com certeza, haverá bolsões de resistência que os militares americanos terão muita dificuldade em derrotar. As forças dos EUA têm capacidade para derrotar as forças iraquianas sem grandes problemas. Porém, por conta da forte possibilidade de que haja combates urbanos, parte da missão dos americanos tende a ser duríssima.

Folha - Combates urbanos costumam provocar a morte de inúmeros civis, não é?
Nash -
Tenho certeza de que os militares americanos não terão civis como seus alvos. O problema é que, indubitavelmente, Saddam colocará alvos militares, sobretudo aqueles associados a armas de destruição em massa, em zonas urbanas. Com isso, as forças aliadas serão obrigadas a atacar algumas das áreas em que vive a população civil. Não haverá combates urbanos simplesmente para tomar terreno de Saddam, mas porque as zonas urbanas deverão ser usadas por ele para esconder material militar.

Folha - Por que os EUA não tratam a Coréia do Norte como o Iraque?
Nash -
A questão está diretamente ligada à probabilidade de um país fornecer armas de destruição em massa a terroristas, que não hesitariam em usá-las contra os EUA. Sim, a Coréia do Norte é um problema, mas ela dificilmente poderia fornecer armas nucleares a terroristas capazes de utilizá-las internacionalmente.


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