São Paulo, quinta-feira, 21 de abril de 2005

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AMÉRICA LATINA

Na avaliação brasileira, faltou habilidade a Gutiérrez; o prefeito de Quito, Paco Moncayo, é visto como sucessor

Brasil tentou reunir "amigos do Equador"

ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA

O Brasil tentou articular uma espécie de "grupo de amigos do Equador", a exemplo do que já houve para a Venezuela, mas não houve tempo. Agora, avalia que o vice-presidente Alfredo Palacio, que assume a presidência, é um médico sem tradição e sem apoios políticos e que o mais provável é haver eleições em quatro meses.
À noite, o Itamaraty divulgou nota de dois parágrafos afirmando que acompanha a situação no Equador "com preocupação" e fazendo um "apelo às forças políticas": que tentem "conciliar suas posições em torno de solução constitucional que assegure a restauração da normalidade institucional, da estabilidade interna e da paz social para todos os equatorianos, com respeito aos direitos humanos".
Com a perspectiva de que o vice Palacio exerça uma Presidência efêmera, não houve intencionalmente menção ao nome dele. O Brasil preferiu destacar o processo, sem se comprometer com pessoas nem com soluções específicas.
O prefeito de Quito, Paco Moncayo, é um dos principais líderes da oposição e considerado um candidato provável numa eventual eleição daqui a quatro meses. Ele mantém bons contatos com o Brasil e chegou a admitir a intermediação de países vizinhos para a solução para a crise.
Uma dessas saídas seria como a arquitetada no Peru: um governo de coalizão para dar sobrevida ao governo até a sucessão presidencial normal.
Na avaliação brasileira, porém, faltou habilidade política para o presidente Lucio Gutiérrez, que foi eleito com plataforma e alianças de esquerda mas acabou deslizando para o centro e, enfim, para a direita. Perdeu o que tinha, não conquistou o que não tinha.
Como não soube articular apoios dos aliados nem negociar com a multifacetada oposição, Gutiérrez estava com 4% de popularidade, segundo pesquisas que chegaram ao Planalto. O golpe final foi quando a crise chegou às ruas e as Forças Armadas lavaram as mãos. "Falência múltipla de órgãos", comparou um diplomata brasileiro.
A crise é tida como essencialmente política, já que a economia tem bons indicadores e avaliação positiva, conforme destacou ontem o assessor internacional do Planalto, Marco Aurélio Garcia, que esteve no país duas semanas atrás, almoçou com Gutiérrez e teve contatos com a oposição, inclusive com o prefeito Moncayo.
Segundo Garcia, a inflação no Equador é de 1,2% ao ano, a menor do continente, e o país está se beneficiando dos preços internacionais do petróleo e da queda do dólar (a moeda equatoriana é dolarizada). "O problema é político."
Na terça-feira passada, durante encontro de chanceleres da América do Sul, no Itamaraty, o governo brasileiro chegou a assinar um memorando de intenções com o equatoriano para três grandes projetos: construção da estrada Quito-Guayaquil, ampliação do aeroporto de Tena (região ao norte do país) e a venda de aviões da Embraer.
"Tenho certeza de que, qualquer que seja o novo presidente, vai manter esses projetos, tão importantes para os dois países", disse Garcia.
Ainda ontem, antes da queda de Gutierrez, seus assessores telefonaram para Marco Aurélio Garcia sondando sobre a possibilidade de retomar a idéia do "grupo de amigos", que poderia ter a participação, por exemplo, do ex-premiê da Espanha Felipe Gonzáles e do ex-presidente brasileiro José Sarney.
Às 16h30, porém, descendo de um avião em São Paulo, Garcia soube da queda de Gutiérrez. Quando ligou para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Brasília, ele já tinha sabido pelos serviços de notícias em tempo real. Não está prevista a ida de nenhum interlocutor brasileiro para Quito.


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