São Paulo, sábado, 21 de agosto de 2004

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ANÁLISE

Exigência de entrega de armas é utópica

JUAN MIGUEL MUÑOZ
DO "EL PAÍS", EM BAGDÁ

As exigências irrenunciáveis do primeiro-ministro iraquiano, Iyad Allawi, são o desarmamento do Exército Mehdi, a milícia de Moqtada al Sadr, e seu compromisso público e por escrito de que não retomará as armas no futuro. Para isso, oferecem-lhe uma ponte para a via política, inclusive quando as ameaças são mais contundentes.
Contudo, na eventualidade de que o líder da insurgência xiita aceite a rendição, haveria algum modo de controlar a entrega de armas? É quase impossível, em um país onde abundam fuzis automáticos, lança-granadas e morteiros. Basta comprovar como uma infinidade de civis celebra com tiros nas cidades iraquianas os acontecimentos que despertam seu entusiasmo.


Na eventualidade de que o líder da insurgência xiita aceite a rendição, haveria algum modo de controlar a entrega de armas pelas milícias? É quase impossível, em um país onde abundam fuzis automáticos


No templo do imã Ali, na cidade sagrada de Najaf, refugiam-se há dias 800 seguidores do clérigo radical, e uns poucos milhares mais vieram dos rincões sulistas para juntar-se à insurgência.
O Exército Mehdi é composto por cerca de 10 mil homens que se declaram tão convencidos da vitória sobre os americanos como prontos para o martírio. Poderiam entregar seus armamentos e abandonar o santuário algumas centenas de seguidores de Al Sadr. Mas os ataques das últimas semanas em Basra, Nassiriah, Amara, Kut, Diwaniya e Karbala, as mais importantes cidades do sul do Iraque, têm sido contínuos.
O desarmamento de uma milícia irregular -basta que os xiitas rebeldes tirem a fita verde da cabeça e entreguem suas kalashnikovs- configura uma árdua tarefa, para não dizer utópica.
Allawi tem reiterado que não permitirá a presença de grupos armados à margem das forças de segurança iraquianas. Mas o que acontecerá então com a milícia Badr, um corpo paramilitar sob as ordens da Assembléia Suprema para a Revolução Islâmica no Iraque, partido que forma parte do atual governo e que teve um papel preponderante nas revoltas xiitas contra o regime de Saddam Hussein?
E qual será o destino dos peshmergas curdos? Membros dos dois principais partidos do Curdistão também integram o governo. Nesse caso, além disso, se dá a circunstância de que a Lei Administrativa Transitória, que rege o Executivo desde a transferência de soberania pelos americanos em 28 de junho, permite explicitamente que os guerrilheiros curdos continuem armados. Nenhuma menção foi feita ultimamente sobre esse beco sem saída.
Não se pode descartar que, para o chefe do Executivo, sejam mais relevantes imagens de televisão em que Al Sadr aparecia renunciando à violência diante de todo o país do que uma entrega de armas que não deixaria de ser um ato simbólico.


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