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Oposição fracassa em lucrar com debilidade dos Kirchner
Fragmentação e falta de táticas impedem que opositores herdem votos perdidos pelo governo
Crise com agropecuaristas deteriora imagem de casal presidencial, e o único a capitalizar é Julio Cobos,
o vice rebelde de Cristina
ADRIANA KÜCHLER
DE BUENOS AIRES
No fim do ano passado, quando o ex-presidente Néstor
Kirchner (2003-2007) passou
a faixa presidencial para sua
mulher, Cristina, analistas políticos apontavam que o casal
havia criado a estratégia perfeita para se alternar no poder durante anos. Tinha maioria confortável no Congresso e o feito
de ter recuperado o país de uma
de suas piores crises.
Neste ano, no entanto, o cenário mudou, e o kirchnerismo
enfrentou sua primeira crise. O
conflito com o setor agropecuário, que durou mais de quatro
meses, gerou locaute, desabastecimento e panelaços.
A crise chegou ao auge e ao
fim quando o projeto de aumento de impostos às exportações de grãos, que deu início à
briga, caiu no Congresso com o
voto de Minerva do vice-presidente, Julio Cobos.
O cadáver mal esfriara quando voltou à tona o chamado caso da mala, em que se especula
que Caracas tenha financiado a
campanha presidencial de
Cristina Kirchner.
O mau momento para o governo parecia mais que favorável para a oposição botar as asas
para fora. No entanto, enquanto a imagem do governo ante o
público piora, a de líderes opositores está estagnada.
Vácuo
"O conflito do campo provocou uma queda na imagem de
Néstor e Cristina, mas não houve uma transferência desses
"votos" para a oposição", explica
o analista Fabián Perechodnik,
da consultoria Poliarquía. "Há
um vazio na opinião pública. A
oposição não consegue se colocar como alternativa."
Uma das deficiências da oposição, segundo analistas, é a sua
fragmentação e a incapacidade
de traçar alianças estratégicas,
como faz o kirchnerismo. "É
quase impossível que a oposição consiga se unir e garantir
maioria nas eleições legislativas do ano que vem", afirma o
analista Ricardo Rouvier, que
presta consultoria a Cristina.
"Cada partido quer ter seu
próprio candidato, e, mesmo
com menos votos que em 2005,
o governo deve ganhar de uma
oposição que está dividida."
Se uma pessoa conseguiu lucrar com a deterioração na
imagem do governo, foi justamente alguém que aderiu ao
kirchnerismo. Julio Cobos foi
expulso de seu partido, a União
Cívica Radical (UCR), de oposição ao peronismo, quando decidiu integrar a chapa de Cristina. Mas foi ao votar contra ela
que ganhou popularidade.
Mesmo tachado de traidor
por muitos, Cobos é hoje o político mais popular da Argentina.
Dois meses após o fim da crise,
continua com cerca de 60% de
imagem positiva.
"É marcante que Cobos seja o
mais popular, já que é, ao mesmo tempo, uma referência da
União Cívica Radical, de oposição, e do governo. Isso mostra
que há figuras, mas não forças
com impacto na política atual",
afirma Perechodnik.
Além de Cobos, outros dois
políticos aparecem hoje como
possíveis nomes para concorrer contra um dos Kirchner nas
eleições presidenciais de 2011:
a líder da frente de oposição
Coalizão Cívica, Elisa Carrió,
segundo lugar nas últimas eleições, e o prefeito de Buenos Aires, Mauricio Macri, do Pro.
Um sinal da crise da oposição
é que nenhum dos possíveis
candidatos é da UCR, que foi a
segunda força política argentina, oposta ao peronismo, no
antigo sistema bipartidário.
"Desde a crise que derrubou
[o ex-presidente Fernando] De
la Rúa (1999-2001), o radicalismo se debilitou e deixou de ser
uma opção", explica o analista
político Hugo Haime, que vê na
ausência da oposição relação
com uma grande crise dos partidos políticos. Hoje, a Argentina tem cerca de 700 partidos,
quase todos sem projeção e
centenas deles criados após a
crise de 2001.
Diante de tanta dispersão,
Haime diz que a principal força
de oposição hoje está dentro do
próprio peronismo. Após a crise com o campo, o Partido Justicialista se fraturou e fez ressurgir líderes como o ex-presidente Eduardo Duhalde (2002-2003). Ele, que ajudou Kirchner a chegar ao poder, mas logo
foi mandado para escanteio,
começou a articular uma alternativa ao kirchnerismo para as
eleições presidenciais de 2011.
No melhor estilo peronista
de construir alianças ecléticas,
como faz o kirchnerismo, Duhalde já ensaiou aproximar-se
de Cobos e Macri. E é o principal incentivador das candidaturas dos populares e midiáticos líderes ruralistas que encabeçaram o conflito contra o governo nas próximas eleições.
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