São Paulo, quinta-feira, 21 de novembro de 2002

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Para ex-ministro francês, "guerra é inevitável"

MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO

Uma ofensiva militar contra o regime do ditador iraquiano, Saddam Hussein, liderada pelos EUA, é "inevitável" porque Washington quer ter influência sobre as reservas de petróleo do Iraque, de acordo com Michelle Vauzelle, governador da região administrativa Provence-Alpes-Côte d'Azur, situada no sudeste da França, e ex-ministro da Justiça do país.
O socialista Vauzelle, 58, que presidia a Comissão de Relações Exteriores da Assembléia Nacional da França durante a Guerra do Golfo, protagonizou a última visita de uma autoridade européia a Bagdá antes do início do conflito, em janeiro de 1991. Ele disse que queria "entender por que Saddam não buscava evitar a guerra".
"A situação atual é distinta. Sou contrário a um novo conflito no golfo Pérsico porque ele poderá causar um levante em regiões árabes ou muçulmanas... Mas a guerra é inevitável, já que os EUA, percebendo que a Arábia Saudita é instável, querem ter acesso aos recursos petrolíferos iraquianos", disse.
"Os americanos tiram proveito do caos internacional atual para obter vantagens para o futuro. O Iraque e seu petróleo se inserem nesse quadro. Os EUA sabem que, em dez anos, a China poderá ser uma potência mais influente. E a Rússia poderá estar numa melhor situação que a atual, buscando ampliar sua zona de influência."
Vauzelle participou ontem de um encontro com jornalistas brasileiros e franceses em São Paulo. O evento era destinado à divulgação da assinatura de acordos de cooperação entre sua região francesa e a prefeitura ou o governo do Estado.
Quanto à sua visita ao Iraque, em 1991, Vauzelle guarda "lembranças interessantes". "Quando cheguei ao Iraque, [o vice-premiê iraquiano] Tareq Aziz demonstrou irritação, dizendo que eu deveria ter chegado mais cedo. Logo percebi que minha missão não seria fácil."
"Após receber a informação de que poderia reunir-me com Saddam, fui a seu encontro. Chegando ao palácio, ele me recebeu em trajes militares... Nós nos sentamos, Saddam retirou um revólver de sua cintura e o pôs sobre a mesa. Percebi que tinha de fazer algo, peguei minha caneta e também a coloquei sobre a mesa", descreveu Vauzelle, sorridente.
Enfatizando que a situação em 1991 era diferente da atual, pois o "Iraque tinha invadido outro país", ele explicou que, em seguida, Saddam passou a expor sua visão das relações internacionais. Segundo o ditador, para compensar a superpotência dos EUA, a Europa e o mundo muçulmano deveriam ter um papel mais importante.
"Para Saddam, a França tinha de assumir a liderança na Europa, e o Iraque, no mundo árabe. Ele queria ser um califa, como os que existiam no passado. Ele pensava que a derrota militar os tornaria mártires, contribuindo para seu plano", apontou Vauzelle.
De acordo com ele, "a mudança de regime no Iraque é desejável; a guerra, não". "Deveríamos usar outros meios."


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