São Paulo, domingo, 22 de março de 2009

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Premiê turco avança para se reeleger

Graças a apoio de camadas populares, partido AK, de Recep Erdogan, é franco favorito na disputa do dia 29

Rivais acusam líder de ser autoritário e populista; sigla governista, cujas raízes são islâmicas, escapou em 2008 de ser dissolvida pela Justiça


DELPHINE STRAUSS
DO "FINANCIAL TIMES", EM BALIKESIR, TURQUIA

Se o partido governista da Turquia, o Justiça e Desenvolvimento (AK), sair vitorioso das eleições marcadas para o próximo dia 29, o sucesso poderá ser atribuído sobretudo à popularidade de seu líder, Recep Tayyip Erdogan. Quer esteja criticando o presidente de Israel diante da mídia mundial pela guerra na faixa de Gaza, combatendo os barões da imprensa em seu país ou tentando desfazer a suspeita de que quer islamizar a Turquia, Erdogan é a figura dominante na política turca.
O premiê vem percorrendo o país de norte a sul há semanas, exortando multidões de simpatizantes agitando bandeiras a dar um novo mandato ao AK, após um ano em que o partido, de raízes islâmicas, escapou por pouco de ser dissolvido pela Suprema Corte por suspeita de solapar o secularismo.
Erdogan estava em plena forma persuasiva no domingo passado em Balikesir, no noroeste do país, intercalando farpas lançadas contra seus adversários com estatísticas sobre construção de moradias e estradas e com versos sentimentais de poetas locais.
"Pensem grande -porque vocês são a Turquia, vocês são Balikesir", ele gritou para a multidão antes de embarcar no ônibus da campanha, do qual atirava brinquedos às crianças que corriam ao lado da estrada.
Tudo indica que seus apelos terão resultado. O AK enfrentará uma disputa difícil em algumas cidades grandes, e, com o desemprego em alta, pode não chegar aos 47% dos votos conquistados nas eleições gerais de 2007. Mas as pesquisas indicam que o partido pode conseguir mais de 40%, o que, pelos padrões históricos turcos, é uma grande vantagem.
Erdogan pode enfurecer os rivais e a elite secularista, mas muitos turcos comuns sentem que o premiê é um deles.
"Ele é um homem de verdade", comentou com uma risadinha uma senhora de meia-idade que o ouviu discursar. Tirando as multidões adoradoras, porém, a situação para o premiê parece mais difícil, na medida em que a crise econômica mundial vem erodindo os ganhos de prosperidade que o país tinha conseguido. O desemprego está em 25% entre os jovens, e, com muitas fábricas suspendendo sua produção, trabalhadores estão retornando a suas aldeias natais.
Apesar disso, o premiê diz que as pesquisas internas do AK indicam que o partido está se saindo "melhor do que as pessoas previam -e melhor a cada dia que passa", mesmo em algumas das regiões onde a disputa é mais apertada.
O Partido Republicano do Povo, a principal agremiação oposicionista, deu uma trégua às acusações de que o AK promove uma agenda religiosa sub-reptícia.
Mas as alegações de que o premiê vem ficando mais autocrático e de que seu partido tenta comprar o apoio dos eleitores começam a ganhar credibilidade. Seus adversários escarnecem dele com cartazes saudando "o último sultão", e colunistas irados de jornais o descrevem como próximo aos presidentes Mahmoud Ahmadinejad (Irã) ou Hugo Chávez (Venezuela).
As comparações são exageradas, mas Erdogan conferiu credibilidade às críticas pelo fato de dar pouca autonomia a seus ministros, trabalhar com um círculo estreito de assessores e fazer críticas ferrenhas a jornais hostis a ele.
O premiê também pisou em terreno perigoso quando elogiou um governador de Província por distribuir geladeiras e lava-roupas gratuitos, justamente quando a temporada eleitoral estava começando, numa iniciativa condenada pelo conselho eleitoral.
Muitos eleitores dizem que vão votar no AK simplesmente porque acham que um município governado pelo partido do premiê tem mais chances de obter do governo central as verbas de que precisa para melhorar os serviços públicos.
O AK também parece estar deixando que a tática eleitoral dite suas políticas. O partido aprovou às pressas um pacote de cortes temporários nos impostos para incentivar a demanda de carros e bens de consumo, mas vem fazendo hora em relação a um acordo potencialmente impopular com o FMI para limitar a severidade da recessão econômica.

"Turco demais"
"O problema de Erdogan não é que ele seja islâmico demais", escreveu o colunista Mustafa Akyol. "É que ele é turco demais. A cultura política do país é baseada na dominação do líder, na retórica do confronto e na ausência de pragmatismo."
A verdadeira pergunta a ser respondida nas urnas não é por que margem o AK vai vencer, mas o que Erdogan pretende fazer com um novo mandato.


Tradução de CLARA ALLAIN


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