São Paulo, segunda-feira, 22 de abril de 2002

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ELEIÇÕES NA FRANÇA

Segurança pública e falta de união na esquerda são consideradas as causas do fracasso de Jospin

Socialistas tentam explicar resultados

DE PARIS

A opinião pública francesa caiu no estupor, assim que as primeiras pesquisas de boca-de-urna começaram a ser divulgadas, apontando que o líder de extrema-direita Jean-Marie Le Pen disputaria o primeiro turno das eleições presidenciais com cerca de 17,2% dos votos válidos.
O resultado não era de todo improvável, porém, pelas indicações das pesquisas anteriores. Le Pen havia disparado nas preferências de votos nas últimas semanas e alcançara cerca de 15%, instalando-se no terceiro lugar, depois do presidente Jacques Chirac, da RPR, e do premiê socialista Lionel Jospin.
As pesquisas também alertavam que 41% dos franceses ainda não haviam decidido o seu voto e poderiam mudá-lo na hora. Como Le Pen conseguira o mesmo total de 15% nas eleições presidenciais de 1995, ficando em terceiro lugar, analistas julgaram que ele não ultrapassaria esse índice agora, deixando o segundo turno para Chirac e Jospin, como antes.
Os cálculos vieram por terra, e o que era apenas hipótese tornou-se realidade. "É um cataclismo", disse o ministro (socialista) da Economia e das Finanças, Laurent Fabius. "É uma das mais graves crises políticas do pós-guerra", afirmou o candidato dos Verdes, Noël Mamère (cerca de 5,5% dos votos).
Na TV, políticos se revezaram durante toda a noite tentando explicar as razões de tal resultado, que desesperou a esquerda, mas preocupa também a direita moderada. Le Pen é inimigo político de Chirac, a quem ele chama de "Jospin piorado".
Entre os motivos para a derrota de Jospin e dos socialistas, a questão da segurança pública é a mais evocada. Pesquisa anterior às eleições mostrou que 58% dos eleitores consideravam o assunto o principal tema a ser tratado na campanha. Chirac centrou nele toda sua ação, assim como Le Pen.
O primeiro secretário do Partido Socialista, François Hollande, acentuou ontem a "utilização abusiva do tema da insegurança" por Chirac como responsável pelo resultado.
Essa também foi a opinião do secretário nacional dos Verdes, Dominique Voynet, que classificou como "demagógica e desonesta" a maneira como a questão da segurança foi abordada na pré-eleição. "Quem semeia vento, colhe tempestade", disse.
O partido de Chirac, o RPR (Reunião Pela República), se defendeu das acusações. Para Nicolas Sakozy, um de seus dirigentes, o RPR não "falou da insegurança para fazer medo nos franceses, mas porque os franceses têm medo". Durante a campanha, Jospin acusou Chirac de "alimentar" a extrema-direita com o assunto.
Outros motivos essenciais aventados a respeito da ascensão de Le Pen foi a desconcentração das forças de esquerda, que se multiplicaram em várias candidaturas, e a capacidade dos socialistas em reuni-las em torno de Jospin.
No total, os partidos de esquerda alcançaram agora 43,5% dos votos, segundo as pesquisas, mais do que nas eleições anteriores, embora distribuídos entre sete diferentes partidos -11,3% deles dados a agremiações de extrema esquerda. Os 2% de votos obtidos pela candidata do Partido Radical de Esquerda, Christiane Taubira, já ajudariam na eleição de Jospin. O resultado previsto também representa uma grave derrota para o Partido Comunista.
"A explosão da oferta política que levou à atomização das vozes é a primeira causa da desqualificação (da esquerda). Mais particularmente, a alta muito forte registrada pela extrema esquerda constitui a primeira novidade à esquerda", analisou o jornal "Le Monde".
O candidato da Liga Comunista Revolucionária, Olivier Besancenot (extrema esquerda, 4,4% dos votos), recusou o argumento, dizendo que a "multiplicação das candidaturas não é responsável pelo crescimento da extrema direita. É o resultado da política da esquerda plural no governo (socialistas-verdes-comunistas), que se desligou dramaticamente das camadas populares nas eleições".
Os erros da campanha de Jospin também são contados como responsáveis pelos resultados. Um dos mais graves foi ele ter afirmado, logo no início da campanha, que seu programa não era socialista. Ao final da campanha, teve que mudar de rota, enfatizando o discurso de esquerda, ao ver seus votos migrarem para outros partidos.
Outro erro seu foram as referências agressivas, aos olhos dos franceses, que fez a Chirac. Chamou-o de "velho" e "com uma visão crepuscular da França". Também referiu-se à "usura" do presidente.
Além disso, a hesitação de Jospin e a do Partido Socialista em abordar frontalmente a preocupação maior dos franceses com a segurança, por julgá-la uma questão da direita, deixou a impressão que colocava o problema em segundo plano. (ALCINO LEITE NETO)


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