São Paulo, segunda, 22 de junho de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

MEMÓRIA VIVA
Homenagens ao ex-presidente de 87 anos que recuperou valores tradicionais do país se multiplicam
EUA "beatificam" ex-presidente Reagan

O edifício Ronald Reagan, o segundo maior prédio público de Washington, inaugurado em maio passado JAVIER VALENZUELA
do "El País", em Washington

Qual é o nome do maior edifício público de toda a área metropolitana de Washington, excetuando o Pentágono? Ronald Reagan Building and International Trade Center, inaugurado no dia 5 de maio.
Como se chama o aeroporto da capital? Ronald Reagan National Airport. A mudança de nome foi decidida este ano pelo Congresso.
O que aconteceu com a fazenda que o ex-presidente tinha na Califórnia? Acaba de ser comprada pela Young America's Foundation para ser transformada em templo de culto a Reagan e escola para quadros conservadores.
Quantos lançamentos sobre Reagan estão à venda nas livrarias? Seis, incluindo uma biografia escrita por seu filho, o comentarista de rádio Michael Reagan.
Aos 87 anos e sofrendo do mal de Alzheimer, Reagan mal toma conhecimento de que, dez anos após sua saída da Casa Branca, as homenagens a ele se multiplicam.
Como admitiu um dos congressistas republicanos que brigaram para rebatizar o aeroporto de Washington com seu nome, essa "beatificação" encerra certa urgência. O que se quer é que os EUA reconheçam em vida o velho caubói a quem devem boa parte de seu renascimento imperial.
Foi celebrado recentemente no próprio edifício Ronald Reagan o último grande ato de coleta de fundos para esse novo acréscimo à paisagem de Washington, um complexo que vai abrigar órgãos do governo, um centro comercial e um centro de convenções e conferências internacionais.
Foi um banquete presidido por Nancy Reagan. Ronald Reagan está ausente da vida pública há meses e não compareceu.
O evento teve música de Mstislav Rostropovich, o maestro russo que, depois de expulso do "império do mal", foi acolhido por Reagan. Os 750 convidados, entre os quais estavam Bill Gates, presidente da Microsoft, e Michael Armstrong, da AT&T, pagaram US$ 25 mil por mesa.
A poucos metros da Casa Branca, o edifício Ronald Reagan custou US$ 818 milhões, o dobro do orçamento inicial, e é um dos maiores de Washington.
A principal ironia, destaca o jornal "The Washington Post", é que carrega o nome de um político que venceu duas eleições presidenciais pregando a diminuição do papel do Estado. Também é curioso o fato de que seu principal inquilino é a Agência de Proteção ao Meio Ambiente, que Reagan odiava.
Mas isso não causa incômodo aos republicanos, nem tampouco aos democratas. Gostem disso ou não, o fato é que os EUA de Bill Clinton devem muitas de suas características ao reaganismo dos anos 80, que não passou de uma retomada dos valores norte-americanos tradicionais.
Reagan liderou o movimento de retorno à primazia da iniciativa individual e empresarial (em detrimento dos poderes públicos), ao conservadorismo moral, familiar e religioso, e a uma política externa agressiva, livre dos complexos do Vietnã.
Dos seus oito anos na Presidência, Reagan passou ao todo um ano completo no rancho do Céu, seu refúgio nas montanhas, perto de Santa Barbara, na Califórnia.
Em abril a Young America's Foundation, um grupo de estudantes conservadores, comprou a fazenda por um valor não revelado. Seu objetivo é transformá-la num santuário para a preservação da memória de Reagan, onde serão dados cursos de formação política para jovens de direita.
O ex-ator que virou presidente dirigiu dali o final da ofensiva norte-americana na Guerra Fria. Até o dia em que Mikhail Gorbatchov viajou até o rancho e pôs um chapéu de caubói na cabeça.


Tradução de Clara Allain



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.