São Paulo, domingo, 22 de dezembro de 2002

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VENEZUELA

Estratégia seria cercar palácio e forçar confronto para aumentar pressão sobre Chávez, acabando com impasse atual

Oposição relança "batalha de Miraflores"

DO ENVIADO ESPECIAL A CARACAS

A oposição ao presidente venezuelano, Hugo Chávez, está relançando a hipótese da "batalha de Miraflores" (o palácio que é a sede governamental, em Caracas) na tentativa de forçar um confronto que possa quebrar o impasse que paralisa o país.
"Nenhuma ameaça, nenhuma intimidação vai nos deter. Miraflores é de todo o povo, não de um só setor", disse Carlos Ortega, presidente da CTV (Central de Trabalhadores da Venezuela) e um dos principais líderes da Coordenadora Democrática, a multifacetada coalizão opositora.
Sitiar Miraflores é fundamental, do ponto de vista simbólico, não apenas por ser a sede do governo. Ocorre que as manifestações de massa já se tornaram parte da rotina venezuelana e já deixaram estabelecido que a oposição a Chávez é muito forte.
Não obstante, não bastam para fazer o presidente aceitar o ultimato oposicionista resumido no slogan "vete ya" (vá embora já). É preciso, portanto, um passo a mais que seria gritar o slogan o mais perto possível da sede governamental e/ou provocar uma repressão que leve a um aumento da pressão pela saída de Chávez.
Não é, entretanto, a única batalha à vista. Na noite de sexta-feira, efetivos militares, com apoio de funcionários judiciais, detiveram parte da tripulação do navio-tanque "Pilín León", acusando-a de desacato a uma sentença judicial para que a embarcação voltasse a operar.
O barco, que leva o nome de uma ex-miss Venezuela, está sendo considerado o símbolo da paralisação petrolífera. Fundeado em Maracaibo, carregado com mais de 44 milhões de litros de gasolina, bloqueia a movimentação de outros navios-tanque.
Não é o único fator, mas é um dos principais responsáveis pela escassez de combustível que, por sua vez, se tornou a outra chave da crise (além da "batalha de Miraflores").
Como a greve geral convocada pela oposição desde o dia 2 tem efeitos apenas relativos, é a falta de combustível que leva a uma crescente paralisação de atividades, escassez de produtos nos comércios, filas e aumentos abusivos de preços.

Abastecimento
Normalizar o abastecimento torna-se, portanto, essencial para o governo, embora haja avaliações contraditórias sobre um eventual agravamento da crise de abastecimento.
Há quem ache que a irritação contra o governo só aumentaria. Mas há também quem entenda que a raiva do público se voltaria contra a oposição, ao apontá-la como responsável pela paralisação petrolífera -ainda mais que há uma ordem judicial para que os petroleiros voltem ao trabalho até que a greve seja julgada pela Justiça venezuelana.
O jornalista Pablo Antillano, colunista de "El Nacional", um dos dois grandes jornais venezuelanos, antecipa:
"A greve já não se concebe como uma greve civil, forte e, acima de tudo, voluntária. Percebe-se em sua essência como uma greve petrolífera, forçada, obrigatória e, portanto, violenta, bélica."
Se essa é a opinião de um antichavista, em um jornal furiosamente contrário ao presidente, fica razoável imaginar que a reação do público, chavista ou neutro, pode de fato ser contrária aos oposicionistas.
De todo modo, as batalhas de Miraflores e do "Pilín León" são indicações claras de que a crise tem, crescentemente, um componente de confronto absoluto, marginalizando a eventualidade de uma negociação, que, no entanto, também existe, mas se dá nas sombras.
Confronto que não tem piedade da aproximação do Natal. Ao contrário: o comandante do Exército, general Júlio García Montoya, disse, na segunda-feira, que a greve dos petroleiros, além de uma "sabotagem contra a principal riqueza da Venezuela", representava "o sequestro do Natal". (CS)


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