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TIRO PELA CULATRA
Mahuad recorreu à medida para recuperar apoio quando tinha apenas 7% de aprovação em pesquisa
Dolarização fracassa como golpe político
EDGAR HERNÁNDEZ
da "Efe", em Quito
A decisão do governo equatoriano de substituir a moeda nacional, o sucre, pelo dólar, visando acabar com a especulação
cambial, não conseguiu pôr fim
ao clima de incerteza em que o
Equador está mergulhado há
mais de um ano. A crise política
piorou ainda mais a situação.
Em consequência da crise econômica e das medidas mais recentes, a disparidade entre ricos e
pobres se aprofundou, com a novidade de que a classe média e os
trabalhadores hoje recebem salários desprezíveis em dólares e que
os preços dos produtos de primeira necessidade dispararam.
Dos 5 milhões de equatorianos
que compõem a população economicamente ativa, 4 milhões recebem menos de US$ 100 por
mês, e a maioria menos de US$
50. Enquanto isso, os preços dos
produtos tendem a equiparar-se
aos do mercado externo.
O governo Mahuad esperava
que a estabilidade traria os investimentos que, nos últimos anos,
chegaram ao Equador em conta-gotas, esperando que com isso a
economia seria reativada, com geração de empregos, e que a força
do mercado melhoraria a situação das camadas mais pobres da
população.
A proposta de dolarizar a economia, lançada no último dia 9 de
janeiro, chegou num momento
de desespero político do governo
Mahuad, quando sua popularidade caíra para 7% e as pressões por
sua renúncia chegavam de todos
os lados, da extrema esquerda até
a direita.
Foi nesse momento que o presidente deu a sua última cartada.
Conseguiu o apoio dos setores
mais poderosos e das Forças Armadas para a dolarização, mas levou os setores populares a sair às
ruas em protesto.
O anúncio da dolarização causou um impacto tão grande que
os analistas divergiam semana
passada quanto a suas possíveis
consequências, apesar de a aplicação ter se tornado duvidosa agora, mesmo com o novo presidente
a apoiando.
Tudo depende da seriedade do
Executivo em aplicar uma política
fiscal severa e mostrar-se conservador com os gastos públicos.
As consequências da medida
também dependem do rumo que
poderá ganhar o movimento popular indígena, do respaldo que
obtenha dos políticos, tradicionalmente oportunistas, e da possibilidade de os militares conservarem a ordem pública sem derramamento de sangue. Tudo isso
fica agora em suspenso.
Sem fôlego
Faltava ainda levar a cabo a difícil tarefa de atrair investidores,
que estavam céticos em relação à
solidez da medida e à capacidade
de liderança do ex-presidente.
O tanque de oxigênio de que
Mahuad se dotou ao anunciar a
mudança de modelo foi insuficiente diante da greve lenta, mas
segura e crescente decretada pelos
movimentos sociais liderados pelos indígenas, que, em protestos
anteriores, deram mostras de
grande capacidade de resistência.
As manifestações, que em princípio contavam apenas com o
apoio dos indígenas, foram recebendo o respaldo paulatino dos
cidadãos comuns, fartos da especulação galopante e da falta de novas definições.
A dolarização não surpreendeu
os equatorianos, já que há muitos
meses os bens e serviços já vinham sendo cotados em dólar, e o
sucre estava tão desprestigiado
que merecia ser tirado de circulação. Assim, não é muito que se
perde ao retirar a moeda nacional
do mercado.
Mahuad parecia ter recuperado
algum capital político com o
anúncio da dolarização e contava
com respaldo aparente no Congresso equatoriano. Mas a duração desse apoio foi curto, com os
militares mudando de lado e o
movimento popular ganhando
força.
Anteontem, no momento em
que a crise política precipitava-se,
o Executivo estava empenhado
em ganhar apoio para a chamada
"Lei Troleibus", que visa regulamentar o novo sistema de dolarização, e para isso estava revendo
seu esboço com a ajuda de especialistas nacionais e estrangeiros.
Os movimentos sociais, por sua
parte, se mantêm intransigentes
em seu empenho de continuar
suas manifestações pelos direitos
indígenas e contra a dolarização
econômica.
Tradução de Clara Allain
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