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COMENTÁRIO
Na guerra civil colombiana, a verdade é a vítima
CLÓVIS ROSSI
DO CONSELHO EDITORIAL
Já se disse que, na guerra, a
primeira vítima é sempre a
verdade. A guerra, neste caso a
guerra civil travada na Colômbia, parece ter feito da verdade a
vítima mais uma vez, na semana
passada.
Trata-se do caso de Elvia Cortés, pequena fazendeira, 55 anos,
assassinada com a detonação de
um colar de explosivos colocado
por desconhecidos em volta de seu
pescoço.
O colar explodiu nove horas e
35 minutos depois de colocado em
Elvia, na segunda-feira, 15, quando especialistas tentavam desativá-la.
Imediatamente, as forças de segurança culparam as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da
Colômbia), que lutam há quase
meio século contra o governo colombiano e contra grupos paramilitares de direita, numa guerra
que matou 35 mil pessoas só nos
últimos dez anos.
Mais: o presidente Andrés Pastrana, que, desde a sua posse há
dois anos, tenta levar adiante um
processo de paz com a guerrilha,
suspendeu as negociações, ante o
inevitável e explicável horror provocado pelo atentado (horror reproduzido em todos os grandes
meios internacionais de comunicação).
"Não há palavras para repudiar
essa ação, pela qual até as bestas
se envergonhariam", disse Pastrana na ocasião.
Repúdio
Não adiantou as Farc emitirem
comunicado oficial, três dias depois, negando a autoria do crime
e, ao contrário, repudiando-o
energicamente.
Agora, o governo é o primeiro a
admitir a possibilidade de inocência das Farc. "Está cada vez
mais claro que as Farc não são
responsáveis pelo assassinato com
o colar-bomba de Elvia Cortés",
disse, anteontem, Camilo Gómez,
alto comissário para a paz, ao
anunciar a retomada das conversações com a guerrilha.
Explica-se, mas não se justifica,
o fato de que a verdade tenha sido
atingida na guerra de informações que faz parte inexorável de
toda guerra.
Explica-se, em primeiro lugar,
porque as Farc já haviam desmentido antes atentados pelos
quais finalmente se comprovou
que eram responsáveis.
Mas não se justifica porque havia elementos suficientes para
que dedos acusadores não fossem
apontados em qualquer direção
antes de uma investigação mais
aprofundada.
Esmeraldas
A revista colombiana "Semana", por exemplo, ouviu do prefeito de Chiquinquirá (a cidade
onde ocorreu o crime contra a fazendeira) que "aqui não opera
nenhuma frente das Farc".
Os parentes da vítima disseram
à mesma revista ter certeza de
que o fato nada tem a ver com o
grupo guerrilheiro.
Preferem atribui-lo a delinquentes comuns (os autores do
atentado exigiram 15 milhões de
pesos ou US$ 7.500 para desativar
o artefato explosivo).
Há ainda a suspeita de que o
crime possa estar relacionado
com as atividades dos comerciantes de esmeraldas (a Colômbia é
uma grande produtora).
Seja como for, o fato é que o processo de paz na Colômbia tem inimigos suficientes para que qualquer um deles se anime a praticar
atos que o inviabilizem, jogando
a culpa em terceiros.
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