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Bush exagerou perigo iraquiano em discursos pré-guerra, diz jornal
ROBERTO DIAS
DE NOVA YORK
O presidente dos EUA, George
W. Bush, exagerou o perigo representado pelo regime iraquiano
em pelo menos dois importantes
discursos antes da guerra, apontou ontem o jornal "The Washington Post".
O diário teve acesso a documentos secretos do serviço de inteligência do país. Os papéis, diz o
"Post", mostram que o presidente
americano declarou publicamente ter informações que, ao menos
na época, ainda não haviam sido
confirmadas pelo seu governo.
A revelação surge em um final
de semana em que meios de comunicação americanos discutiram o que Bush chamou, há uma
semana, de "revisionismo histórico": no caso, o questionamentos
aos argumentos que justificaram
o ataque ao Iraque.
Além do "Post", também dedicaram atenção ao tema o jornal
"The New York Times", as revistas "Time" e "The Nation" e a rede de televisão CNN.
Em discurso feito em outubro e
transmitido pela televisão americana, Bush disse que o Iraque representava perigo para os EUA
porque o governo tinha evidências de que o regime de Saddam
Hussein mantinha laços com a organização terrorista Al Qaeda.
Mas, publicou o "Post", um relatório feito à época com as informações recolhidas pelos diversos
braços da inteligência americana
usava linguagem mais cautelosa e
colocava em dúvida a confiabilidade da informação.
Bush chegou a dizer que as ligações entre Saddam e a Al Qaeda
"ocorriam há uma década".
O que a inteligência americana
sabia, porém, era um tanto diferente. O relatório concluiu que
houve sim contatos entre Saddam
e a Al Qaeda -mas no início dos
anos 1990, quando a organização
terrorista ainda engatinhava. À
época, ambos tinham como principal alvo o governo saudita, então um aliado fundamental dos
EUA no Oriente Médio.
O texto conclui que não se sabia
se esses contatos continuaram a
ocorrer desde então, como indicou Bush em seu discurso.
Estado da União
Em outra importante aparição,
o tradicional "discurso sobre o estado da União", feito em janeiro,
Bush apontou que o Iraque retomara seu programa nuclear,
usando como base para isso apuração da inteligência britânica, segundo a qual o país estaria comprando urânio na África.
Mas, disse o "Post", um enviado
da CIA a Níger meses antes relatou que o governo de lá negava tal
informação e apontou que documentos que comprovariam a venda teriam sido forjados.
Os documentos da inteligência
americana foram revelados após a
primeira semana de trabalho da
comissão de deputados americanos que investiga a apuração que
levou à guerra. Pressionado pela
oposição democrata, o Senado
poderá abrir inquérito parecido.
Já o "New York Times" abordou
o assunto em análise intitulada
"Bush pode ter exagerado, mas
será que ele mentiu?"
Levando o "revisionismo histórico" ao extremo, o jornal lembrou casos de outros presidentes
americanos que tiveram suas declarações contestadas.
Apontou que as afirmações sobre o Iraque são para Bush o que a
guerra do Vietnã representou para a credibilidade de Lyndon
Johnson (1963-69), o Watergate
para a de Richard Nixon (1969-74) e as escapulidas sexuais para
Bill Clinton (1993-2001).
As dúvidas sobre as declarações
de Bush antes da guerra reavivam
o bloco que se opôs ao ataque.
Em anúncio publicado na semana passada, a ONG MoveOn
anunciou o início de uma campanha para solicitar que o Congresso instale uma comissão especial
sobre o assunto. "O presidente levou o país à guerra baseado na asserção de que o Iraque representava ameaça iminente. Agora, a evidência que embasou essa afirmação está sendo derrubada."
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