UOL


São Paulo, quarta-feira, 23 de julho de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Mulheres de Bagdá eram as que mais sofriam com poder de Uday

SÉRGIO DÁVILA
DA REPORTAGEM LOCAL

Além da onipresença de Saddam Hussein em forma de estátuas, imagens e murais e da falta de manutenção dos prédios principais, uma característica das ruas de Bagdá chamava a atenção dos 180 jornalistas estrangeiros na cidade durante a Guerra do Iraque: a total ausência de mulheres.
Não havia representantes do sexo feminino à vista, e não era culpa do fundamentalismo dos xiitas, pois estes dominavam as cidades mais ao sul do país; na capital, quem mandava eram os sunitas, como o próprio Saddam, mais liberais em relação às mulheres.
Quem matou a charada foi um dos guias da Folha durante a cobertura do conflito, Alah Jarboo: "Nossas mulheres não saem às ruas porque têm medo de Uday".
Não era exagero. Conforme a Folha veria depois da queda do regime, quando a população passou a falar abertamente sobre Saddam e sua família, as iraquianas aprendiam desde cedo que deveriam temer o primogênito dos Hussein, morto ontem.
Uday, 39, era presidente do Comitê Olímpico (em cuja sede ordenava e assistia sessões de torturas de desafetos), chefiava a Associação de Futebol (cujos jogadores levavam surras se não rendiam bem) e dirigia o Sindicato dos Jornalistas iraquianos (comandava o maior diário, "Babel", e o canal de TV Jovem).
Eleito deputado em 1999, gostava da vida noturna e de carros esportivos estrangeiros -sua coleção chegava a 200 automóveis, e o povo conta que a principal estrada do país, a Expressway 1, que liga Bagdá à capital jordaniana e foi feita pela brasileira Mendes Júnior, teria sido construída a pedido de Uday para que ele pudesse frequentar as boates de Amã.
Nos últimos anos, depois de ser preterido à sucessão do pai por matar a pancadas seu assessor mais querido e sofrer uma tentativa de assassinato que o deixou manco e com dores terríveis, ele foi ficando cada vez mais violento, especialmente com as mulheres.
Ficaram famosas suas saídas de carro pelo bairro Al Mansur à procura de garotas bonitas, que eram sequestradas por seus guarda-costas, levadas para um de seus palácios e estupradas -na maioria das vezes, um dos seguranças gravava tudo em vídeo, depois mostrado aos amigos de Uday em festinhas privadas.
Foi numa de suas academias particulares de ginástica que marines norte-americanos encontraram dezenas de recortes de revistas com fotos das filhas gêmeas de George W. Bush, algumas em montagens que colocavam Jenna e Barbara, 21, em poses eróticas.
Uday mantinha uma relação de ódio com o irmão Qusay, 37, também morto ontem. O caçula do primeiro casamento de Saddam era o sucessor natural e comandava todo o aparato de segurança do regime. Em contraste com a exuberância psicótica do irmão, era valorizado pela discrição.
Aqui, de novo sobre as mulheres recaía o fardo da obsessão do primogênito de Saddam por seu irmão mais novo e mais bem-sucedido: nos últimos anos do regime, Uday desenvolveu o hábito de mandar raptar as ex-namoradas de Qusay. Estuprava-as e as marcava, tatuando a letra "U", de seu nome, em suas nádegas.


Texto Anterior: EUA dizem ter matado filhos de Saddam
Próximo Texto: Comentário: Momento é oportuno para Bush
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.